Mundos pequenos e abertos para se viver.
Enquanto alguns jogos exaltam ter um número absurdo de quilômetros quadrados em seu mundo aberto, sempre comparando com criações anteriores e orgulhosamente mencionando como possuem duas, três ou até quatro vezes o tamanho de outras obras (como abordado nesse outro lindíssimo artigo), outros jogos seguem um caminho diferente. Ao invés de se referirem aos espaço de jogo como regiões, estados ou países, eles usam bairros ou até mesmo uma única casa. Assim criando mundos pequenos e reativos.
Por exemplo, temos Deus Ex Mankind Divided. Lançado em 2016, o jogo tem como ambiente central a cidade de Praga, na República Tcheca. Porém, ao invés de ser uma região gigantesca, sendo trafegável unicamente por meio de carros e aviões, o espaço disponível se limita a alguns bairros. Com isso em mente, a escolha da ambientação exemplifica exatamente o que queremos abordar com o presente texto.
Tendo criado um ambiente reduzido, os desenvolvedores dedicaram seu tempo para fazê-lo extremamente detalhado e vivo.
A quantidade de imóveis abertos, os quais são mobiliados e desenhados de maneiras únicas, junto com o minucioso trabalho de elaboração das ruas e avenidas serve para transmitir a sensação de que se trata de um lugar onde pessoas de fato vivem e existiu muito tempo antes do personagem principal pôr os pés lá.
A franquia não é estranha a construções de mundo dessa maneira. Desde o Deus Ex original, lançado em 2000, a série foca em espaços críveis e reativos às ações do jogador. Todavia, tal visão não seria possível em um ambiente gigantesco, estendendo-se por quilômetros no horizonte. Obras como essa servem para demonstrar o que ocorre quando não há pressão e expectativa para que um jogo seja grande pela mera necessidade de ser grande.
Os lugares podem ser mais bem construídos, as ações podem ser mais variadas e as histórias, mais pessoais. Mas talvez a grande qualidade de mundos abertos pequenos, porém densos e detalhados, é a forma como, no grande teatro que é um jogo, o mundo deixa de ser palco e se torna personagem.
Sem contar que, com um ambiente reduzido e administrável, alguns desenvolvedores podem, assim como os de Deus Ex, focar em um atributo difícil de alcançar, mas universalmente apreciável. A reatividade.

É possível que mundos reajam a você?
Contudo, vamos clarear o que queremos dizer com jogo ser interativo ou, mais precisamente, reativo. Teoricamente, todo jogo com uma mínima interação por parte do usuário possui algum tipo de reatividade.
Nessa linha de raciocínio, até o mais básico dos clones de GTA reage às ações do jogador. Você atira (bate, atropela, explode…) em alguém, esse alguém morre.
Todavia, o que ocorre nos jogos voltados para uma abordagem reativa é que a obra leva em consideração o que o jogador faz, com o quê tal coisa é feita e contra o quê ou quem a ação é realizada.
Seguindo tal argumento, temos o grande designer de jogos, Warren Spector. Criador do clássico Epic Mickey (e de Deus Ex), ele possui uma ideia peculiar.
Tal ideia consiste em um RPG feito inteiramente em um bloco de uma cidade ou até mesmo em um único prédio. O foco é criar um ambiente que seja extenso como uma poça, mas profundo como o oceano, fazendo ambientes tão únicos como interativos.
O que pode ser surpreendente é que diversos jogos, direta ou indiretamente, conseguiram realizar o conceito de mundos abertos limitados.

Ações com significado.
Temos o injustamente pouco conhecido Consortium. Trata-se de um jogo de ficção científica em primeira pessoa, o qual se passa inteiramente em um avião. Todas as suas escolhas influenciam a história e o mundo ao seu redor. Qualquer problema possui mais de uma solução, até mesmo o fracasso é válido e avança a trama.
Porém, longe dos mundos futuristas, temos Hitman. Muito embora o jogo não se venda como um mundo aberto, suas muitas missões são em ambientes com um tamanho considerável e detalhamento invejável. Peguemos o exemplo de Sapienza.
Mansões luxuosas e laboratórios secretos são apenas alguns dos locais que a cidade italiana apresenta. Contudo, não desvalorizando o submundo de conspirações internacionais dignas de 007, é a ambientação litorânea nem tão excepcional e seus habitantes que rouba o espetáculo.
Com inúmeras lojas e empreendimentos exploráveis, assim como diversas pessoas com personalidades diferentes para interagir, a fase é um pequeno mundo que implora para que o abordemos de diversas maneiras diferentes, dando sempre respostas diferentes.
Dito isso, o que lugares como as cidades de Deus Ex, o avião de Consortium e as missões de Hitman têm em comum? Simples, eles são lugares de verdade.

Mundos pequenos e limitados… Porém verdadeiros.
Muito embora não seja sem fim, Kamurocho existe. Bem, tecnicamente, o bairro fictício da franquia de jogos Yakuza é exatamente isso, fictício. Mas você não pensa nisso enquanto joga.
Os desenvolvedores elaboram cada construção, beco e avenida com zelo e esmero dignos de personagens principais, fazendo com que a localidade do jogo seja considerada tão importante quanto os protagonistas que nela habitam.
Ainda que seja a ambientação dos 8 (!) jogos da franquia principal, o tempo a faz mudar constantemente. Projetos de renovação e expansão presentes como plano de fundo em um determinado jogo ficam prontos nas sequências, dando luz a novas estruturas e, por consequência, aventuras.
E isso carrega uma forte importância. O jogador se sente acolhido pelo mundo do jogo, como se fosse um lugar visitado tempos atrás, deixando a ilusão de um cenário fictício e se tornando algo mais, bem, vivo.
E o que seria de uma cidade sem suas histórias?
Os contos que a franquia consegue apresentar vão muito além de missões superficiais, focadas em aumentar o tempo de jogatina. Com um ambiente mais limitado, os desenvolvedores conseguem dar a atenção necessária para cada conto presente no mundo.
Assim sendo, os habitantes de Kamurocho acabam sendo mais do que plano de fundo. Suas tramas pessoais possuem abordagens únicas, com início, meio e fim, incluindo reviravoltas e continuações.
Vale ressaltar que o que pretendemos dizer com este presente artigo não é que todo o jogo deveria ser idêntico ao Deus Ex, Yakuza ou Hitman. Variedade é o tempero da vida, afinal de contas.
Porém, é inegável o quanto se pode aprender com as obras apresentadas, pois não é à toa que sempre estão em listas de “melhores jogos já feitos”. Com isso em mente e já tendo apresentado a questão dos jogos com mundos abertos extensos até demais, sobre o que resta falar?
Bom, nem todos os jogos tentam ser grandes ou reativos, alguns almejam algo mais… Diferente.