Introdução
É inegável afirmar que saúde mental é um dos temas do momento, e isso não é de agora. Afinal, já faz uns anos que o assunto tem entrado em voga na indústria do cinema, e em jogos não é diferente, como visto jogos como Life is Strange ou Hellblade. E um dos aspectos mais abordados do assunto, em qualquer mídia, é com certeza a depressão. Além disso, é importante estabelecer que é muito difícil abordar esse tema, que envolve muitas sensibilidades diferentes. É ai que um problema aparece: é necessário discutir saúde mental, mas também complexo e não pode ser feito de forma irresponsável. Especialmente agora, em tempos de pandemia, o que já era um tema muito debatido se expandiu exponencialmente. E foi nesse contexto de quarentena de 2020 que eu tive o prazer de experienciar Depression Quest.
O jogo se trata de uma ficção interativa baseada principalmente em texto, desenvolvida pelo estúdio The Quinnspiracy e lançada para os navegadores gratuitamente em 2013, e que ganhou uma versão para a Steam em 2014. Além disso, o jogo também conta com um formato “Pague o que Quiser”, onde você escolhe quanto quer pagar e uma parte dos lucros são doados à uma instituição de prevenção de suicídio.
A premissa do jogo é simples: você joga como uma pessoa vivendo com depressão que, ao longo da trama, lida com uma série de eventos cotidianos e tem que manejar seu transtorno psicológico, relacionamentos, trabalho e possíveis tratamentos. Como jogador, você toma as decisões que constroem uma história bem curta, mas com ramificações significativas, resultando em múltiplos finais.
Lidando com a depressão
Acredito que o brilho de Depression Quest surge em como ele realiza a construção das suas escolhas. O jogo mantém uma barra com a condição atual do seu personagem diante da depressão, que começa com “Você tem depressão”. Dependendo do seu status no momento, encontram-se travadas as melhores escolhas possíveis.
O que significa que diante da sua condição, nem sempre você pode tomar as melhores escolhas possíveis e isso influencia diretamente sua qualidade de vida. Obviamente, há decisões que afetam esse status positiva ou negativamente, e é essa condição que vai influenciar qual dos cinco finais você pode liberar. E as decisões que influenciam positivamente quase nunca são as melhores possíveis, que vão estar travadas pelo seu status. E claro, se o status cair muito, nem essas estarão disponíveis.
Desse modo, o que se resulta é uma experiência agoniante, onde você fica constantemente tendo que seguir em frente sabendo que não tem condições de tomar a melhor decisão possível para sua situação. Apesar disso, é possível se esforçar ao máximo para que seu personagem consiga viver melhor.
Lidando com o tempo
Na verdade, Depression Quest é tão eficiente com o pouco tempo que tem, em torno de uma a duas horas de jogo, que consegue construir uma imersão sem igual. Não é nem um pouco difícil adentrar na mente do personagem principal, e lendo os primeiros parágrafos e fazendo algumas das primeiras escolhas o jogo já consegue construir um personagem e situações completamente identificáveis e familiares para alguém que já lidou com depressão.
Além disso, o jogo também oferece uma ótima perspectiva de como é conviver com o transtorno para aqueles que não o possuem. Além disso, o jogo consegue abordar múltiplos temas que envolvem saúde mental: o preconceito internalizado, o julgamento de outras pessoas e a dificuldade que elas podem ter para entender a sua condição. E o mais importante, como tudo pode ficar melhor. Desse modo, Depression Quest também oferece uma perspectiva bem responsável de como buscar ajuda.
Conclusão
Claro que nem tudo são flores, afinal, estamos falando de um jogo baseado em texto que dura pouco menos que duas horas. Obviamente ele não é um retrato perfeito da depressão e jamais poderia ser. Ora, estudamos essa doença há anos, que se manifesta de forma diferente em cada ser humano. Seria impossível criar uma representação a qual todos pudessem se identificar.
Ainda assim, talvez experienciar Depression Quest possa te trazer um pouco mais de empatia. Talvez você se identifique com as situações ilustradas. De qualquer modo, acho que tem algo nessa experiência que sirva para muita gente. E se as reviews da Steam servem de referência (ignorando um review bombing que o jogo sofreu por questões pessoais dos desenvolvedores), o jogo conseguiu ressoar com muitas pessoas.
Talvez ressoe com você também.