Introdução
Atualmente os jogos multiplayer estão muito focados em conectar as pessoas ao redor do mundo (ou país), parece que esqueceram o quão bom é sentar com alguém próximo e zerar algum jogo. Certamente, de partidas online esquecíveis até um jogo onde a presença do outro é indiferente em termos de mecânica, a essência do multijogador perdeu espaço com a globalização. It Takes Two resgata essa essência.
A obra é uma ode aos jogos cooperativos, com certeza um dos melhores já feito no estilo até hoje. Desenvolvido pela Hazelight Studios e distribuído pela Eletronic Arts, o jogo foi lançado dia 26 de março para Playstation 4, Playstation 5, Xbox One, Xbox Series X e S e também para PC.
Uma história simples e segura
Com o intuito de dar corda para que o jogo aconteça, a história contada por It Takes Two não é inovadora e nem apresenta recursos mirabolantes em seu roteiro. Contudo, isto não é problema, que prima por sua jogabilidade.
Dito isso, a história se passa na casa de Cody e May, um casal que está com os dias contados, já preparados para o divórcio. Eles resolvem contar para Rose, a filha do casal, que não entende o porque os pais não são mais amigos.
Logo após receber a notícia, a filha encontra um livro do amor e, chorando, pede para que seus pais sejam amigos novamente. É neste momento que a mágica acontece e a jogatina começa de fato. A relação do casal precisa ser consertada e é esse nosso trabalho.
Mesmo que a história não seja o ponto forte dessa obra, ela é segura. Não arrisca em plots, mas mantém uma constância agradável e que, além de ditar o ritmo, amarra as mecânicas e acontecimentos de forma primorosa.
Tudo o que há em It Takes Two tem um motivo para estar lá.

Sobre a jogabilidade
It Takes Two é sinônimo de maestria. Afinal, o game é recheado de conteúdo de diversos estilos e muito bem feitos, do roteiro seguro até uma mecânica de um mini jogo específico. Os controles simplificados tornam o acessível e também facilita na hora de refinar os detalhes da produção.
A jogabilidade é o ponto alto da obra. Uma vez que o jogador entra em contato com o controle, ele se une genuinamente ao personagem controlado e com o mundo ao seu redor. A simplicidade dos comandos permite que essa união seja natural e fácil. Os controles básicos são um pulo e um dash, os demais, são situacionais.
Apesar de serem situacionais, o jogo os exige quase que o tempo inteiro. Isso porque os personagens ganham armas diferentes a cada ato do game para que consigam vencer aquela fase. Porém, para facilitar a assimilação dos controles, todas as armas usam botões parecidos.
Ao longo da obra, eu me perguntava se em algum momento ficaria repetitivo, afinal, os comandos eram muito parecidos e simples. A reposta é não. Eles conseguiram diversificar na simplicidade, criando ocasiões que fizessem sentido com cada arma.

Cooperação dentro e fora do jogo
A chave de It Takes Two é a colaboração (CO-LLA-BO-RA-TION!). Dito isso, é impossível jogar sozinho, em qualquer hipótese. Mesmo ligando dois controles localmente para jogar com os dois personagens, a colaboração precisa ser, quase sempre, simultânea.
Por isso eu disse que o game resgatou a essência do multijogador. Aquela sensação de chamar um amigo em casa para jogar durante a tarde inteira, com a tela dividida e trabalhando juntos. Muitas vezes, perdidos no mapa e buscando uma solução de como avançar, surgiam momentos cômicos e outros frustrantes, mas sempre marcantes.
It Takes Two traz essa experiência de volta, da melhor maneira possível. Desde o início até a última parte, os dois jogadores estão trabalhando em conjunto para atingir o objetivo principal. Entre tapas e beijos, erros e acertos, os jogadores precisam aprender a colaborar, assim como os personagens principais.
Bem como cada pessoa tem mais facilidade para fazer algo do que outra, o game joga isso na cara da dupla o tempo inteiro. Hora um jogador vai entender o que precisa ser feito, hora o outro entenderá.

Jogando com um amigo (Pedro)
Ao ver o lançamento do jogo, ficou evidente com quem eu deveria joga-lo. Uma amizade com mais de dez anos não pode perder tal experiência, ainda mais quando a obra envolve uma relação em sua narrativa. É difícil colocar em palavras a sensação que foi jogar It Takes Two com meu melhor amigo.
Não é somente sobre a diversão, a obra é sobretudo sobre relacionamento. Claro que um jogo engraçado e muito bem feito como este pode ser jogado por duas pessoas não muito próximas que continuará sendo uma ótima experiência, mas perde um pouco seu valor.
O jogo já começa com a difícil decisão de quem jogará com qual personagem, afinal nós ainda não os conhecemos e é um tiro no escuro. Conforme avançamos, nós descobrimos que estávamos jogando com os personagens certos para cada um. Os protagonistas tiveram atitudes condizentes com os jogadores, ampliando a intensidade do que acontecia na tela. Não eram apenas palavras e ações jogadas, era o reflexo de uma relação de dez anos aceita pelos dois.
Em um certo momento da jogatina eu comentei: “Nossa, seu personagem elogia o meu e o meu não te elogia.” e rapidamente eu fui rebatido com: “Então tá certo, porque na vida é assim também.”. Embora eu tenha comentado na inocência, eu sabia que a resposta seria aquela. E está tudo bem, porque aprendemos a lidar com isso.
Assistir e ajudar o casal a cooperar e entender um ao outro foi como revisitar os dez anos passados da nossa amizade. Foi relembrar cada momento de dificuldade e como nós nos resolvemos. Foi como reviver todo esse tempo sabendo o que precisava ser feito.

Jogando em casal (Visão de Nana e João)
Com uma narrativa que fala de amor e relacionamentos, jogar esta obra fenomenal tem um significado especial para casais. Toda a temática gira em torno da cooperação, comunicação e confiança no seu parceiro. Isso se traduz muito bem em jogabilidade, e também para lições no mundo real.
No jogo, temos um casal que está tendo que reaprender a trabalhar juntos, e do lado de fora, temos um casal que está aprendendo a como um ajudar o outro a avançar nos puzzles.
O que torna o cooperativo de It Takes Two diferente de outros jogos, é o fato de que não é possível avançar sem ajuda. Em outros jogos, a cooperação é incentivada, porém os desafios propostos geralmente são os mesmos que você enfrentaria no Single Player, mas com inimigos mais fortes, ou mais itens a coletar. Portanto, cada jogador faz as coisas do seu jeito, e nem precisa se preocupar com o outro.
Porém, aqui a comunicação e coordenação é essencial, e um cuida do outro. Uma cena emblemática é da escalada. Resumidamente, Cody e May estão subindo uma montanha durante uma tempestade de neve. O vento é tão forte que joga os dois para longe. Porém, cada um tem um imã que o puxa para placas coloridas. Assim, é preciso revesar o trabalho, enquanto um se puxa com o imã para a segurança, o outro deve se segurar no companheiro, até a ventania passar.
Isso pode ser interpretado como as dificuldades da vida, e como o casal deve um apoiar o outro para poder superá-los. Porém, essa visão não fica apenas a esta passagem, e pode ser expandida para toda a experiência do jogo.
It Takes Two ensina na prática como um casal é construído na confiança e no apoio mútuo, onde um pode conta com o outro.
Diversidade na jogabilidade
Durante todo o momento, o que mais chamou a minha atenção foi a quantidade de coisas para se fazer. Todos os cenários são construídos com muita coisa para interagir, mesmo que seja muito simples.
Além dessas interações com o cenário, existem diversos minigames espalhados pelos mapas para disputar contra seu parceiro. Feitos parar gerar uma disputa saudável entre os jogadores, eles são simples e divertidos. Os mini jogos variam bastante, indo de dança da cadeira até um tabuleiro para jogar xadrez.
Ou seja, explorar o mapa garante encontrar easter eggs, algumas coisas para interagir e conteúdo extra. A exploração por sua vez é bem intuitiva, com indicações bem claras de onde pode ou não ir.
Outra parte importante é a diversidade no próprio estilo do jogo. Há momentos em que jogamos um Action RPG (lembrando Diablo), como também precisamos controlar um navio e derrotar inimigos (lembra bastante Sea of Thieves), além de outros modos diferentes.
It Takes Two supreende com toda essa pluralidade em sua jogabilidade. Eu não esperava que encontraria essa diversidade na obra e, quando me deparei com ela, fiquei muito feliz. Até porque o planejamento e execução dessas partes foram bem feitas.

Direção Artística
Começarei essa sessão com uma salva de palmas para a equipe de It Takes Two. Afinal, não é todo dia que encontramos um jogo tão rico em cenário, iluminação, animação e conteúdo no geral quanto este aqui.
A criatividade reina na construção dos atos. Os atos se passam em lugares específicos da casa, desde a árvore no quintal até o globo de neve do casal. Os criadores mergulharam em cada cenário para trazer vida a eles. O estúdio responsável por A Way Out saiu do estilo hollywoodiano e embarcou em um estilo mais mágico, o que trouxe a possibilidade de viajar em ideias.
Todos os cenários são construídos de maneira primorosa, com atenção aos detalhes e um level design invejável. Em nenhum momento nos sentimos perdidos na fase, até porque as cores fazem um belo trabalho de guia. E falando nelas, que jogo bonito! Em todos os momentos eu admirava o cenário e suas cores fortes e vivas, que conversam muito bem com o tema e momento.
O trabalho sonoro aqui também é impecável. Desde a dublagem dos personagens até os efeitos de Cody arremessando pregos. A mescla de partes jogáveis com cinemáticas é quase imperceptível graças ao som do jogo que nos mantêm atentos ao que está acontecendo.
As músicas são boas e presentes o tempo todo. Elas amarram o pacote de imersão que a Hazelight nos oferece. Músicas calmas, intensas, emocionantes, todas estão presentes e cumprem com seu papel. Fica uma atenção especial para o último ato do jogo, onde a música atinge o seu ápice e arrepia ao jogar!

Conclusão
Se você gosta de jogar com amigos, It Takes Two é essencial para você. O jogo surpreende a todo momento o jogador, seja na beleza ou na troca de estilos de jogo, além de manter um nível técnico altíssimo em todas as suas partes, do início ao fim. Uma experiência nostálgica, mas, ao mesmo tempo, nova. O estúdio responsável já trouxe esse modo de cooperar em A Way Out, mas ele aprimora e evoluí suas ideias em It Takes Two. Sem dúvidas, um jogo que marcará a vida de muitos e que caminhará comigo pelo resto da vida, afinal, meu amigo estará lá para lembrarmos de cada momento que passamos juntos aqui.
*Chave concedida para análise