O incrível absurdo de The Evil Within.
Existem poucos jogos como the Evil Within. Caso fosse começar falando da trama, ela acompanha o detetive Sebastian Castellanos enquanto ele e sua equipe respondem a um pedido de ajuda em um hospital. Aí o lugar ganha proporções impossíveis, você escapa para uma floresta, depois para uma cidade medieval e luta com uma aranha gigante em uma cidade destruída.
A ausência de coesão e continuidade, que poderia muito bem ser um ponto negativo, é uma das maiores qualidades da obra. O jogo avança em um ritmo incessante, com embates grotescos e grandiosos. Ele marcha com a contagiante confiança de alguém que diz: “fiquem tranquilos, eu sei o que estou fazendo”.
E sim, a japonesa Tango Gameworks, empresa por trás da obra, sabe muito bem o que está fazendo. O fato de, até o presente momento, ter apenas The Evil Within e sua sequência em seu portifólio pode gerar alguma desconfiança inicialmente.
Afinal de contas, seria muita audácia uma empresa dizer que fará do seu primeiro jogo uma obra que não só beberá da fonte dos clássicos do horror, como tentará ficar em pé de igualdade.
“Seria” muita audácia, se não tivesse um dos pais do horror moderno na sua liderança.
Shinji Mikami – criador da franquia Resident Evil, da empresa Capcom – fundou a Tango Gameworks e dirigiu o primeiro jogo da franquia. Conforme lembramos do papel dele na indústria dos jogos, cada vez mais as direções tomadas ficam claras.
Todavia, a obra funciona muito bem caso você não tenha toneladas de bagagem cultural, porém, entendendo um pouco do gênero do horror faz com que os eventos apresentados se tornem mais do que meros… bem, eventos e passem a ser algo mais conhecido para os amantes do gênero.
E, principalmente, são uma janela para a mente de um homem que, ainda que seja um medroso, tem um talento nato para a arte de assustar.

Uma viagem pela mente de Shinji Mikami.
Na trama da obra, viagens pela mente e sonhos são pontos fundamentais. Porém, mais do que adentrar a imaginação dos personagens, é no imaginário do criador do jogo que fazemos nossa jornada.
Tendo trabalhado em diversas obras, muitas das quais foram feitas enquanto atuava na Capcom, Mikami já produziu, dirigiu e supervisionou a criação de diversos mundos diferentes.
E em The Evil Within ele tem a oportunidade de apresentar um pouco de tudo.
Um claustrofóbico hospital culmina em uma floresta abandonada, a qual leva para um laboratório secreto e que termina em uma mansão gótica, até chegar no ponto que a ambientação não mais se dá o trabalho de ser minimamente natural.
Obviamente, dentro da trama, tudo possui um motivo de ser como é. Porém, o jogo acaba sendo, intencionalmente ou não, uma visita guiada pela longa e variada história do horror.
De certa forma, The Evil Within serve como uma álbum de “Greatest Hits” de um gênero musical. Contudo, ao invés de apresentar as 12 melhores músicas de pagode, ele mostra os melhores lugares para tomar um susto.
E junto com a ambientação, os seus habitantes também incorporam esse espírito de “registro do melhor do horror”. Todos os adversários remetem a algo do gênero: temos os clássicos zumbis, o maníaco da serra elétrica, aranha gigante, espírito com o cabelo longo e muitos outros que, de uma forma ou de outra, você já viu em algum lugar.
Contudo, não quer dizer que eles são previsíveis ou genéricos. Todo lugar e personagem que a obra apresenta tem um estilo próprio de The Evil Within, levando um conceito familiar e apresentando-o de forma única… E muitas vezes grotesca.

Anos de Survivor Horror, condensados em The Evil Within.
Beleza, sabemos que andamos por lugares sombrios (hehehe, disse o título) e enfrentamos inimigos tão sombrios quanto, mas como jogamos? Muito simples, na verdade, você já jogou Resident Evil 4?
O jogo bebe muito da fonte da obra que foi uma divisora de águas para a indústria, o que não é surpresa, pois tiveram o mesmo diretor. Contudo, mais do que copiar a jogabilidade do clássico, The Evil Within leva para outras direções.
Sim, o jogo é de tiro em terceira pessoa, porém, assim como os primeiros da franquia Resident Evil, ele insiste que você seja cuidadosa com seus itens. Fora isso, ele também usa elementos de Stealth – a arte de andar agachado para não ser visto – na maneira de jogar, tanto que o primeiro capítulo e as expansões do jogo são baseados inteiramente nesse elemento.
Essa união de diversos estilos serve para demonstrar como o jogo consegue ser, ao mesmo tempo, tanto um representante das inúmeras formas do horror como também ser algo próprio.
Assim sendo, jogar The Evil Within é ver como uma pessoa (Shinji Mikami) pega tudo que aprendeu e observou ao longo de sua carreira em uma única obra. Obviamente, nem sempre o resultado é perfeito. Contudo, a execução faz do jogo mais do que uma mera referência ou homenagem ao passado.

O gênero do horror ganha outro representante.
Surpreendentemente, há algo engraçado na forma que o jogo progride, incluindo suas expansões: é como ele lembra a franquia Resident Evil. Não, não um jogo específico da saga, mas a franquia como um todo.
Como falamos em outros textos sobre esses clássicos do terror (aqui e aqui), Resident Evil consegue significar muitas coisas para muitas pessoas. Tem jogos de terror mais lentos e metódicos, tem jogos voltados para a ação e tem também a mais recente revitalização da série.
The Evil Within consegue, em um único jogo, ter um pouco de tudo que a franquia da Capcom apresenta. Os elementos de horror, economia de recursos, ação explosiva e momentos furtivos se unem de uma maneira que teria tudo para dar errado, porém funcionam muito bem.
Jogos como Silent Hill, Fatal Frame e (grande parte de) Resident Evil possuem um ritmo crescente em suas jornadas. Eles começam calmos e contidos, para então chegar nas partes mais emocionantes. The Evil within é diferente.
O jogo é tudo, menos sutil. Seu horror é explosivo, gritante e grotesco. Os momentos de calma e tranquilidade são como uma pessoa pegando ar antes de voltar a gritar.
The Evil Within é estranho, barulhento e esquisito. E faz tudo isso com muita elegância.