Introdução
Em primeiro lugar, Florence é um jogo de point click que utiliza com maestria suas mecânicas para passar um sentimento ao jogador. Colocando de forma certeira diferentes interações, sempre conectando o jogador com a história que está sendo contada.
Em segundo lugar, a Annapurna Interactive não teve medo de contar o que quer contar. O jogo tem apenas 50 minutos de duração, mas garanto que valerá cada minuto imerso nas reviravoltas da vida de Florence. Abordando temas como amor e rotina, o jogo se mostra, além de tudo, poético e profundo.
A rotina é uma armadilha?

É possível que você já tenha se encontrado reflexivo e pensando em como sua vida segue uma linha lógica que se repete semanalmente, mensalmente ou anualmente. O jogo começa colocando o jogador para executar ações rotineiras como escovar os dentes, mexer nas redes sociais, trabalhar…
Entretanto, assim que comecei a mexer nas redes sociais de Florence me questionei imediatamente o quanto isso era estranho, mas familiar. Conforme o jogo avançava era automática a sensação de angústia e de empatia pela vida apática dessa garota que tanto me identifiquei. A rotina é uma ilusão que ajuda a camuflar o fato de vivermos pelos outros e pelos sonhos dos outros.
Trabalhe duro e ganhe uma promoção no trabalho, isso fará você ganhar mais dinheiro e, por consequência, menos tempo. Tudo isso gerou em mim a vontade de entender mais sobre Florence, além de torcer para que sua vida melhorasse. Movido pela empatia de querer ser livre e querer vê lá livre, fui fisgado pela curiosidade de acompanhar onde essa história iria parar.
Um reflexo da infância
Porém, antes de mais nada, algo me chamou a atenção. Nos primeiros minutos de jogo Florence sonha com sua infância e em uma tática de narrativa muito interessante, fui convidado a pintar um barquinho com figuras coloridas.
No entanto isso não dura muito, sua mãe corta seus devaneios criativos e a coloca para estudar matemática. Definitivamente isso me fez pensar que esse sonho não era só mais uma lembrança qualquer, mas sim uma busca à sua infância, uma semente que foi enterrada e, por hora, esquecida.
Eu senti que essa parte em específico mexeu comigo, quantas vezes tentei ser eu mesmo e fui cortado, pois os números que me representavam detinham maior importância que qualquer outra tentativa de expressão. Por sorte, o amor sempre pode nos salvar.
Amor – início, meio e fim

Tudo muda quando o amor entra em cena!
O amor dentro do jogo representa a quebra da rotina, situação muito bem representada através de um acidente de bicicleta seguido do primeiro contato direto de Florence com seu mais novo par romântico, o músico Krish. É a partir desse momento que através das mecânicas a relação desses dois é contada com maestria.
Sem muito suspense, o primeiro encontro acontece e os diálogos entre Florence e Krish não apresentam textos ou falas, na verdade, são apenas quebra-cabeças. O jogador deve montar esses puzzles e a cada encontro eles se tornam mais fáceis, pois assim como as peças dos quebra-cabeças, os dois estão se encaixando.
Da mesma forma, os conflitos entre o novo casal vão se intensificando e os quebra-cabeças mudam de forma, saindo de algo redondo para formas quadradas e pontudas. É desse modo que recebi a informação que a relação dos dois já não ia muito bem, mas deixo o desfecho dessa relação para você leitor jogar e descobrir.
A rotina voltou, Florence caiu no mesmo buraco de antes e agora precisa seguir em frente, precisa abraçar a si mesma e se empoderar.
Reencontro

De fato não há desafio maior que se reencontrar, é doloroso olhar para o passado e aprender com ele. Florence encontra no barquinho que pintou em sua infância a chance de regar a semente que por muito tempo ficou esquecida. Ela finalmente está livre, uma artista surge e agora Florence Yeoh é contemplada pela sua arte.
Ao olhar para seus reais desejos, não aqueles vendidos pela sociedade, nem aqueles que sua mãe queria. A protagonista atinge um estado de espírito raro e poderoso. O jogo Florence inspira, ensina e é a mais pura poesia.
Da rotina não consigo fugir.
Da rotina não devo fugir!
Pois se eu viver pelo que amo.
A rotina não será um fardo.
Será um abraço, diário!
E viverei contemplado.