Essays on Empathy é uma compilação de 10 jogos criados pela Desconstructeam, sendo 9 deles já lançados anteriormente e 1 inédito. Seu objetivo é oferecer novas experiências narrativas para o jogador.
Ele é distribuído pela Devolver Digital e foi lançado para PC em 18 de maio de 2021.
Como começar
Essa análise vai ser um pouco diferente das demais já que, afinal, o jogo analisando também é bem diferente.
A minha primeira ideia para começar o texto era escrever pequenas análises individuais de cada jogo dentro da coletânea.
Mas, provavelmente ficaria chato depois do terceiro ou quarto jogo analisado. Por isso, eu espero que você acompanhe esse texto com a mente e principalmente, o coração aberto.
E assim como esse texto, o próprio Essays on Empathy é um pouco complicado de se começar.
Não se preocupe, eu explico.
Dez jogos e uma experiência
Ao abrir o jogo, você já é abordado no menu para decidir qual caminho seguir. Cada jogo é uma miniatura e quando você passa o mouse por cima, é possível ouvir uma nota musical.
Não existe uma ordem específica para se jogar. Mas, se assim como eu, você gosta de seguir um padrão, o primeiro a ser jogado é ‘Underground Hangovers’. O que, coincidentemente (ou não), é também o jogo mais antigo da coletânea, desenvolvido em 2015.
Não foi nem de longe o que eu mais gostei dessa coletânea. Seu estilo metroidvania se mostra frustrante e até mesmo um pouquinho confuso.
(Porém, para os amantes do gênero, é um ótimo passatempo).
A questão é que ‘Underground Hangovers’ ainda não tem tanto o sentimento que Essays on Empathy quer passar. E é por isso que eu vou pular o segundo jogo do menu e vou para o próximo: ‘Behind Every Great One’.

A esposa perfeita
Gabriel é um artista de sucesso e Victorine, sua esposa, não tem nenhum tipo de ambição. Por isso, sua única rotina é a de dona de casa: limpar, cozinhar, fumar de vez em quando e jantar com o seu marido.
Até aí tudo normal, certo? Bem, uma das características da coletânea num geral é que todos os jogos possuem um aviso de conteúdo sensível.
E ‘Behind Every Grat One’ logo começa a fazer jus a eles. Como dito, Gabriel e Victorine aparentam ter um relacionamento normal. Saudável até. Entretanto, conforme o jogador realiza as tarefas domésticas e os dias vão passando, as coisas se mostram diferentes.
Gabriel é um personagem extremamente egocêntrico. E embora Victorine seja uma personagem descrita como ‘sem ambições’, na verdade ela está deprimida. E passa por constantes episódios de profunda tristeza e chora subitamente.
Olhando agora eu percebo que toda vez que isso acontecia, eu fazia de tudo para guia-la para um cômodo vazio.
Portanto, o relacionamento aparentemente perfeito finalmente mostra seu lado verdadeiro: Victorine é refém não só do seu relacionamento, mas da sua própria tristeza. E infelizmente, a relações tóxicas mais perigosas são aquelas que não aparentam ser.

A linguagem das flores
Outro jogo que merece destaque em Essays on Empathy é ‘Eternal Home Floristry’. Quem diria que um assassino de aluguel tivesse um lado tão sensível?
Sua história se passa em um futuro distópico onde flores naturais não existe mais. Bem, quase não existem mais.
Sebastian é um idoso dono do último jardim com flores naturais. Elas são poucas e também são as últimas que irão florescer. Ele resgata Gordon de um evento que leva sua mão esquerda e os dois passam a trocar experiências sobre a vida, morte e flores.
Por ser uma floricultura, os pedidos de arranjos de flores estão sempre chegando. Por isso, cabe a nós jogadores, ajudar Gordon a montar belos arranjos baseados no significado de cada flor.
Sebastian é quem explica. Mas, depende de nós colocar esses significados e assim mudar acontecimentos importantes na cidade.
É uma história bastante introspectiva que aborda temas como homofobia e capacitismo. Ambos os protagonistas são gays e possuem alguma característica que, para a maioria das pessoas, é um impedimento para realizar tarefas diárias.
Assim como todos os jogos dessa coletânea, ‘Eternal Home Floristry’ é bem curtinho. Mas, talvez seja o que mais saímos com a sensação de querer mais.
De ouvir mais histórias e de observar o relacionamento de Sebastian e Gordon crescer. Se ao menos, o jardim dele tivesse mais flores…
Se, muitos jogos de Essays on Empathy podem te deixar uma sensação pesada no coração, este com certeza é do tipo de história que deixa ele quentinho. E o melhor de tudo, você pode jogar por várias vezes e testar todos os tipos de combinações de flores!

A comédia nunca foi tão reflexiva
‘De Tres al Cuarto’ é o último e também inédito jogo da coletânea. Ele segue dois comediantes, Garza e Bonachera. Os dois conseguiram um contrato de apresentações em uma ilha paradisíaca e cabe a você ajuda-los a entreter o público com as piadas.
Diferente do estilo point-and-click de alguns jogos e o ‘mexa-seu-personagem-com-WASD’ de outros, ‘De Tres al Cuarto’ é um jogo de deckbuilding.
Para que a apresentação da dupla seja bem-sucedida, é nosso dever usar as cartas para conseguir as melhores piadas possíveis.
As cartas amarelas fazem com que Garza tenha uma resposta engraçada para a piada de Bonachera. As azuis são o ‘build-up’ da piada, uma resposta inteligente, mas que não é o final.
As cartas laranjas são respostas menos engraçadas, mas que ainda te rendem pontos. E as cartas vermelhas são falha completa. O público vai odiar qualquer resposta que você dê usando ela.
Conforme mais respostas boas você acumula, mais moedas ganha e usa elas para comprar cartas melhores para o seu deck.
Caprichado na imersão
Porém, essa mecânica é o de menos. ‘De Tres al Cuarto’ talvez seja o jogo mais imersivo de todos da coletânea.
Talvez por ser mais longo, ele não economiza nos diálogos e na construção da relação entre Garza e Bonachera.
O melhor recurso narrativo é durante as conversas dos personagens. Embora o diálogo exista, o jogo faz questão de explicar e de escrever tudo aquilo que não foi falado ou demonstrado verbalmente.
E isso dá uma profundidade sem igual para a história. Garza e Bonachera são simpáticos por si só, mas são seus pensamentos mais profundos que nos interessam.
Embora a intenção de ‘De Tres al Cuarto’ é de ser um jogo mais leve, ele consegue divertir com as piadas e diálogos inteligentes. Porém, como dito, sua profundidade é imensa. E é assim que ele ganha nossa empatia.

Ter empatia
Eu sei, você deve estar pensando “nossa, mas o jogo se chama Essays on Empathy, por que os temas abordados são tão pesados assim? ”
(Ou talvez esse pensamento tenha só sigo eu mesmo…)
Mas, o que eu quero dizer é que, essa coletânea certamente não é para aqueles que buscam relaxar.
Embora alguns jogos como ‘The Bookshelf Limbo’, onde sua proposta é a de um filho pesquisando um presente de aniversário para o pai. Completamente indeciso com as opções na livraria e cabe a nós escolher o melhor livro para o presente.
Esse sim, não tem temas tão pesados e é literalmente isso: olhar a capa de um livro, ler as reviews dele online e chegar a uma conclusão de qual levar de presente.
A maior parte dos jogos de Essays on Empathy usa o recurso de uma narrativa delicada para passar mensagens fortes e importantes.
Se você lembra lá no começo do texto, a proposta do Desconstructeam é ‘criar jogos com novas experiências narrativas’. E, meu amigo, essa coletânea é exatamente isso.
Talvez o único jogo que você não crie uma conexão forte com os personagens é ‘Supercontinent LTD’. Mas, a ideia inicial dos desenvolvedores ainda está ali.
Afinal, quem poderia imaginar que um jogo sobre fazer ligações em um telefone normal fosse tão divertido?
Se uma conexão com o personagem em si não é formada, ela certamente acontece com o jogo em si. A narrativa é simples, mas envolvente.
Jogabilidade
Já deu para entender que no quesito narrativa, Essays on Empathy dá um show. Mas, como é a experiência de jogar essas histórias?
Cada jogo da coletânea possui suas regras próprias. Alguns são exclusivamente point-and-click, por exemplo Dear ‘Substance of Kin’.
Um dos jogos mais enigmáticos para mim. Seu personagem é um ser místico que chega em uma vila. Ele vai passando de casa em casa e cumpre os desejos mais profundos das pessoas, com o devido pagamento sendo algum tipo de sacrifício.
Outro point-and-click é ‘11.45 A Vivid Life’. Neste você deve explorar o corpo de uma garota que não é exatamente dela. E de acordo com as suas escolhas, constrói o passado dela.
Agora, se você quer um jogo com mais uso do teclado, ‘Zen and the Art of Transhumanism’ certamente é a sua escolha.
Tão peculiar quanto os outros, você é um robô que fabrica peças para androides. Cada peça oferece um upgrade na personalidade do seu cliente. É seu dever receber o pedido e escolher a peça certa que vai cumprir o desejo dele.
Entretanto, nem sempre o que o cliente quer é o melhor para ele. Você também deve ter a perspicácia para entender isso.
E é na hora de fabricar a peça que suas habilidades em coordenação motora entram. Uma mão aperta repetidamente o botão para fazer o molde girar. Enquanto a outra deve moldar a peça.

Dificuldades no controle
Embora Essays on Empathy acerte muito nas suas narrativas significativas, um dos seus problemas está na gameplay.
Embora seja divertido não saber que tipo de gameplay o espera em cada jogo, tive muitos momentos de certa frustração exatamente por não saber o que fazer.
Enquanto alguns jogos te apresentam as mecânicas de um jeito didático, outros simplesmente te dão o controle e você tem que testar sozinho.
Inclusive, o jogo que mais me frustrou nesse sentido foi ‘Substance of Kin’. Ao realizar o pedido das pessoas, devemos desenhar uma linha nas costas delas. Porém, o jogo não te fala qual é a opção certa e qual a consequência disso.
E até mesmo ‘Supercontinent LTD’ não te explica que para digitar os números de telefone você tem que literalmente fazer isso no seu teclado.
O que, depois que você descobre, faz sentido. Mas não existe nada na sua tela que te indique que deve fazer isso.
Pixel art
No quesito visual, Essays on Empathy tem quase todos os seus jogos feitos em pixel art, com exceção de ‘The Bookshelf Limbo’.
É interessante como muitas empresas focam no realismo dos gráficos enquanto a pixel art ainda é uma ótima escolha visual.
Quando a história é significativa, a aparência pode ser a coisa mais simples possível. Isso não muda o impacto da mensagem.
O título de destaque vai para ‘Behind Every Grat One’. Conforme Victorine realiza as tarefas, a cor do plano de fundo muda. Isso representa a passagem de tempo do jogo.
Você começa com um fundo azul que vai do laranja para final de tarde e depois para o roxo, representando a noite.
O mesmo vale para a trilha sonora. Cada jogo possui a sua própria que traduzem muito bem as atmosferas que variam entre mistério, drama e até mesmo comédia.

Essays on Empathy
Em conclusão, a coletânea da Desconstructeam promete e entrega grandes experiências narrativas. Mesmo com alguns probleminhas encontrados na gameplay, o brilho das suas histórias não é apagado.
Essays on Empathy trata temas pesados, mas necessários de um jeito completamente diferente do que estamos acostumados. É definitivamente um jogo necessário tanto para aqueles que gostam de jogos focados em narrativa quanto aqueles que ainda precisam explorar esse lado dos videogames.
Entretanto, você deve jogar com cuidado. Seus temas abordados são sérios e podem afetar negativamente o jogador.
*Chave cedida para análise.
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