Filmes interativos sempre apresentaram um conceito interessante. Pois, todos nós ao assistirmos um filme já tivemos o pensamento “se eu pudesse definir a escolha desse personagem, ele tomaria melhores decisões”. É exatamente está a proposta dos FMV, histórias contadas com atores reais porém com as escolhas feitas pelo jogador.
Night Book foi desenvolvido pela Good Gate Media em parceria com a Wales Studio e foi lançado no dia 27 de julho para iOS, Nintendo Switch, Xbox One, Xbox Series X|S, PlayStation 4, PlayStation 5 e PC, via Steam.
Um formato diferente
Night Book apresenta uma história no formato FMV. Assim sendo, temos aqui um filme em que determinadas escolhas do jogador irão definir o rumo da narrativa. Já tivemos alguns títulos de destaque neste formato anteriormente no mundo dos games, sendo que Night Shift e The Bunker foram alguns que se destacaram.
Entretanto, o novo título da Good Gate Media apresenta uma proposta diferente dos títulos citados anteriormente. O game decide contar sua história usando de elementos que costumo chamar de “a evolução do found footage”. Portanto, o jogo se passa em 90% do tempo em vídeo chamadas, sendo está a principal forma de interação entre os personagens.
A escolha deste formato logo me intrigou bastante. Pois sou bastante fã de filmes que contam suas histórias desta maneira, sendo um deles o “Amizade Desfeita”, filme este que possui varias similariedade com Night Book em questão de storytelling.
Além disso, o game também usa do recurso de câmeras de segurança pela casa. Assim sendo, temos a sensação de estarmos em um ambiente mais amplo e não apenas na tela de um computador. Infelizmente, neste quesito eu esperava uma variedade maior de locais, o que acaba não acontecendo.
Uma introdução bem lenta
O game embora seja surpreendentemente curto, apresenta os seus personagens sem pressa. Loralyn é uma interprete que trabalha traduzindo vídeo chamadas do inglês para o Frances durante o período noturno. A personagem está grávida, porém seu marido precisou sair em uma viagem de negócios. Este fator serve como a justificativa de termos varias câmeras pela casa, pois o homem de Loraryn não queria perder ela de vista.

Além disso, a protagonista está cuidando do seu pai, Alecis, personagem este que está doente e sofre de algum tipo de distúrbio que o faz pensar estar ouvindo espíritos. De todos os personagens apresentados no game, ele foi o mais interessante. Mais pra frente irei entrar em detalhes sobre, entretanto sempre preste atenção no que este personagem diz, pois será importante para o rumo da narrativa.

Após a introdução destes três personagens citados, devemos participar de uma chamada que serve como introdução para o sistema de escolhas do game. Assim sendo, temos que interpretar um vídeo e escolher a forma que iremos traduzi-lo.
A jogabilidade do game é apresentado durante este trecho. Basicamente, o único elemento de gameplay que temos no título é escolher entre duas opções diferentes em momentos pré estabelecidos.

Estas escolhas irão gerar um efeito borboleta e aumentar ou diminuir nosso nível de relação com os outros personagens. Entretanto, por mais que pareça algo complexo, as relações acabam não levando para cenários tão distintos, servindo apenas para mudar um diálogo ou outro.
Escolhas que levam para o mesmo lugar
Depois deste longo tutorial de escolhas e apresentação dos personagens principais, o título realmente começa. Temos que decidir qual será nosso primeiro trabalho da noite. Assim sendo, a chefe de Loralyn dá pra ela duas opções, ela ser interprete em uma negociação ou ajudar um amigo durante uma videocall com sua mãe.
Aqui já temos um ponto que me decepcionou. Pois, independente das escolhas que forem feitas, o desfecho irá ser no mesmo lugar. E isso não fez sentido pra mim, em teoria as duas chamadas deveriam ser totalmente distintas, e misteriosamente as duas envolvem o mesmo livro amaldiçoado?
Certo, isso pode ser considerado influencia dos espíritos ou uma escolha narrativa mesmo… entretanto, essa “coincidência” acabou me desconectando na hora da história.
Após escolhermos qual videocall iremos interpretar, somos apresentados a um livro em uma língua ancestral. Independente da chamada que escolhas interpretar, o texto deste book será lido.
Após isso, a negociação ou a conversa de mãe e filho não irão chegar em lugar nenhum, entretanto, coisas estranhas vão começar a acontecer. Assim sendo, Loralyn irá entrar em uma luta por sobrevivência para tentar salvar a si mesma e sua família.
Personagens que não são cativantes

Um dos grandes problemas que podem acontecer em filmes interativos é não sermos cativados pelos personagens. Infelizmente isso acontece aqui com quase todos, inclusive a protagonista. Embora Loralyn passe por momentos de extrema tensão durante a narrativa, suas reações acabam não convencendo.
Para exemplificar, temos um momento que ela se encontra em uma situação de desespero. Entretanto, a reação da personagem em meio aquilo… simplesmente não convenceu. As atuações dos personagens decepcionam.
Entretanto, nem todas. Pois, o pai de Loralyn conseguiu ser um grande destaque na narrativa. Assim sendo, o personagem participa de diversas cenas que quase chegaram a ser assustadoras. E está situação nos leva a outro problema do game.
Cadê o terror???
Eu me considero uma pessoa chata para filmes de terror. Dificilmente algo do gênero me surpreende atualmente. Porém, Night Book conseguiu ir além e não apresentar nenhum momento verdadeiramente assustador.
Temos presente no título momentos que deveriam causar tensão no jogador, entretanto, por causa dos problemas de atuação citados anteriormente, esse sentimento não acontece. Toda essa situação torna os acontecimentos que deveriam ser chocantes nem um pouco impactantes.
Também somos apresentados a uma situação durante o título que um personagem é possuído. Neste momento escolhas importantes devem ser feitas, pois elas irão definir quem vive e quem morre na narrativa. Entretanto, essa parte conseguiu ser tão irrelevante na minha experiência, que eu escolhi qualquer uma das opções sem me importar muito.
Normalmente eu sou um grande crítico do uso de jump scare. Pois, em grande parte de títulos de terror, este recurso é usado de forma exagerada. Entretanto, em Night Book as coisas conseguem ser tão paradas e nada assustadoras, que em muitos momentos eu não conseguia deixar de pensar o quão útil está técnica cinematográfica do terror teria sido aqui.
Outro recurso usado para tentar estabelecer um clima de horror é o ambiente. Assim sendo, temos prateleiras caindo, coisas sendo arremessadas, portas batendo… e acreditem ou não, uma ventania dentro do apartamento. Infelizmente, nenhum desses recursos consegue criar uma ambientação assustadora, sendo que a maioria deles é previsível.
A presença do sobrenatural
Nos momentos que os espíritos estão presentes é usado uma paleta de cores verde e efeitos visuais para mostrar a presença de uma força sobrenatural.
Neste aspecto, eu dou destaque principalmente para o pai de Loralyn. Pois, em seus momentos de interação com os espíritos, o personagem consegue expressar de forma crível os sentimentos de confusão mental.
O elemento sobrenatural apresentado aqui foi bem feito. Além disso, nos momentos em que certos personagens são possuídos, o visual deles mudam. Eles ficam um um visual mais sombrio e até mesmo começam a falar com uma voz mais grossa e medonha, típica de uma voz de espírito.
Falando neles, a motivação da presença sobrenatural temos aqueles padrão, “você irá ajudar a nos libertar ou vamos matar você e sua família”. E tudo isso nos leva a outro problema que se torna mais grave ao jogar os outros caminhos apresentados.
Falta desenvolvimento de personagem
Os personagens em Night Book não tem um bom desenvolvimento. E isso em soma com os fatores de uma atuação que poderia ser melhor e a falta de elementos assustadores acaba desmotivando o fator replay.
Assim sendo, temos aqui várias rotas para se seguir, porém em nenhuma delas o jogador se importa com o que acontece com a protagonista e os seus entes queridos.
A história nos documentos
Embora o game não seja tão interessante na narrativa, ela compensa um pouco com seus documentos de texto. Pois é, os textos desse game são bem intrigantes e admito que a parte que eu mais curti durante minha jornada em Night Book foi ler estes documentos.
Eles apresentam a história de como surgiu a língua antiga presente no livro amaldiçoado e a sua conexão com os espíritos. Um destes textos por exemplo, conta a relação do marido de Loralyn com o povo nativo relacionado as forças sobrenaturais.
Pois, em determinado momento do game, temos a informação que ele está trabalhando em uma construção que irá interferir diretamente em uma área cultural que tem forte presença dos adoradores da força sobrenatural presente aqui.
Conclusão
Night Book apresenta uma história de terror simples e sem profundidade. O game em diversos momentos mostra uma pitada do que o título poderia ter alcançado se desenvolvesse melhor seus personagens e usasse de maneira apropriada elementos do horror.
Portanto, mesmo o gameplay sendo construído em cima das escolhas do jogador, toda a sua resolução nos 15 finais possíveis não é impactante. Pois, o game não consegue transmitir o desespero que a protagonista está passando nas situações que se encontra.
Além disso, embora os espíritos tenham uma presença promissora, ela acaba sendo prejudicada pelo uso não acertado de elementos batidos do gênero. Assim sendo, um recurso que talvez teria enriquecido o clima de terror, é o jumpscare.
Por fim, o título consegue ser uma experiência ok para apreciadores de um terror mais casual. Entretanto amantes do gênero provavelmente irão se decepcionar com a falta de inovação e escolhas simples de narrativa.
* Chave cedida para análise no Xbox