Introdução
Embora eu sempre diga que gosto de RPG’s japoneses, minhas recentes experiências com eles deixaram a desejar. Talvez seja o momento de parar e refletir. Será que, de fato, é um estilo que eu aprecio? Astria Ascending é um exemplo perfeito para essa reflexão, afinal, demonstra um enorme potencial que se perde na sua execução.
A fim de reviver o estilo mais clássico do gênero, seu combate é em turnos. Já a história acontece em atos, com uma divisão visível de focar em um herói por ato. Além disso, existe também um mini-game chamado J-ster, que acrescenta, além de horas a mais no jogo, um ingrediente de coleção na jogatina.
O estúdio responsável pela obra é o Artisan Studios, e quem publica é a Dear Villagers junto da Maple Whispering. Lançado dia 30 de setembro de 2021 para todas as plataformas atuais (PS4, PS5, Xbox One, Series S e X, Nintendo Switch e PC), Astria Ascending cativa o jogador pela sua beleza nos gráficos, mas peca em outros aspectos.
História
A Harmonia é fundamental em qualquer sociedade, ainda mais quando se trata de uma com grande diversidade racial. Assim é como todos vivem no mundo de Orcanon, baseado-se na harmonia para que todos possam ter seu espaço e função. Contudo, não são todos que enxergam o mundo da mesma forma, portanto, decidem mudar o status qo.
Para tentar manter essa harmonia intocada e também a paz em Orcanon, alguns são escolhidos para se tornarem os Semi Deuses. Estes ganham poderes do zodíaco que aumentam suas forças físicas e mentais. Entretanto, receber esse poder tem um custo: a própria vida. Após a ascensão, restam apenas mais três anos de vida e glória para os escolhidos.
A função dos Semi Deuses é proteger a harmonia em Orcanon e seus residentes, derrotando os ruídos que surgem por todo o continente. Esse é o cenário em que nós somos inseridos na obra. Assumimos o controle dos oito Semi Deuses atuais que precisam acabar com um perigo eminente nos seus três últimos meses de vida.
A estrutura do enredo é bem simples e os heróis não se desenvolvem bem. Cada personagem possui seu momento na história, mas isso não ajuda em nada na evolução deles. Ainda que nós iniciamos o jogo já com todos eles no controle, sem espaço para apresentação nem empatia com eles. Por ser um JRPG, eu esperava que houvesse maior atenção em ambientar o jogador.

Jogabilidade
Astria Ascending possui uma maneira de jogar bem simples: a movimentação é igual aos jogos de plataforma, onde a verticalidade predomina e os combates em turnos.
Quando estamos fora de combate, podemos andar de forma livre pela cidade de Harmonia e por onde já fomos. Mesmo que o jogo inclua algumas mecânicas nessa parte, como, por exemplo, pular um combate ou tentar entrar no mesmo com uma vantagem, é tudo muito monótono. Os mapas não possuem complexidade, caminhos distintos e nem desafios de plataformas para dificultar o objetivo.
Além disso, tem uma mecânica de anéis usados fora de combate para ultrapassar partes que antes não podiam ser exploradas, adicionando um elemento de metroidvania aqui. Porém, o design dos mapas atrapalha, pois são muitos cenários pequenos e o mapa do jogo não é muito claro. Ou seja, muitas vezes eu me perdi andando pelos calabouços e cansei de procurar o lugar que eu queria.
Já no combate, não existe muito segredo. Cada personagem age em um momento (que não sabemos quando, pois não existe nenhuma indicação de ordem no turno) e, às vezes, agem duas vezes antes da primeira ação de outro. As opções são as clássicas de ataque básico, magia, defesa, usar itens, trocar de herói ou correr. A novidade é a ação de foco (explico com mais detalhes na sessão do combate).
Dessa forma, o jogo ficando cansativo, ainda mais porque o famoso “grinding” está presente em Astria Ascending. Olha que eu amo ficar jogando e fazendo a mesma coisa por horas, mas existe um problema muito grande que torna essa ação dolorida.

O combate
O que deveria ser o brilho de Astria Ascending, fez com que ele se tornasse um jogo pesado. Digo isso, pois, os elementos presentes no jogo dão suporte para que a batalha seja o foco principal. Os itens e o sistema de trabalhos e suas constelações foram feitos para que o combate tenha profundidade e atingem seu objetivo, porém, só isso não faz um bom sistema.
Primeiramente, o jogo não tem uma linha do tempo com a vez de cada um no turno, muito menos alguma indicação visual sobre isso. Não dá para pensar e combinar jogadas porque é impossível saber quem irá agir e quando. Além disso, a sinalização visual do que está ativo é bem fraca, o que me fez usar ações erradas em personagens errados diversas vezes.
Outro problema é que não tem como acelerar o combate. Esse é o que faz o jogo perder seu brilho. Afinal, um jogo que precisa repetir batalhas diversas vezes não pode fazer o jogador se cansar delas. Foram incontáveis vezes em que eu não suportava mais esperar a ação dos inimigos para que eu fizesse a minha e finalmente terminasse o combate. A única forma de agilizar o combate é quando temos o nível muito acima dos inimigos, porque aí eles são eliminados de forma automática.
Um ponto positivo para o combate do Astria é a adição do “foco”. Este é um recurso que aumenta o poder dos ataques e das habilidades em escalas de 50/100/150/200%. Esse recurso existe para os dois lados da batalha, medido através do dano que cada oponente causa. Por exemplo, atacar um ponto fraco do inimigo gera dois pontos de foco, enquanto sofrer um golpe efetivo subtrai dois pontos da barra. Essa gangorra traz para o combate uma dinâmica bem legal.
Outros aspectos na batalha
Outro uso para os pontos de foco são as invocações que uma personagem pode fazer. Essas invocações são chefes que enfrentamos no mundo e agora lutam ao nosso lado. Eles entram na batalha e assumem o campo sozinho (mas isso não faz os turnos para nossos heróis passarem). Eles podem atacar e usar magias, sendo essa última opção as que gastam pontos de foco para serem utilizadas e, portanto, são mais poderosas.
Cada personagem pode gastar sua ação para fazer alteração na equipe. Com apenas uma ação, é possível alterar todo o time. Portanto, saber quando e quais alterações fazer é crucial e pode te trazer uma grande vantagem, como também pode trazer a derrota quando mal realizada.

Trabalhos e Constelações
A parte mais interessante do jogo, sem dúvida.
Cada personagem possui uma constelação principal em que pode gastar pontos no caminho que achar melhor. Isto é, você pode decidir qual função cada personagem vai exercer com mais eficiência. Existem algumas opções para seguir que dão bastante variedade para cada herói desde o início do jogo.
Entretanto, a melhor parte só aparece após certo tempo de jogo, quando você consegue designar trabalhos específicos para os Semi Deuses. Cada um deles têm três opções para selecionar como seu trabalho principal. Inclusive, é possível fazer a Ulan, sendo primariamente defensora, se tornar uma maga que causa muito dano. Essa flexibilidade é bem legal e entrega diversas possibilidades de builds.
Entretanto, o combate de Astria Ascending também atrapalha aqui.
Para podermos evoluir essas constelações, é necessário gastar pontos e orbes que só conseguimos lutando. Ou seja, para farmar os pontos que nos permitem evoluir na árvore de habilidades, precisamos passar por diversas (muitas mesmo) batalhas. A média que eu ganhava por batalhas era de 3 a 4 pontos, sendo que uma habilidade na constelação pode chegar a custar 120 pontos.
Pelo menos, esses pontos são únicos para cada personagem. Afinal, caso não fosse, seria impossível progredir de uma maneira saudável no jogo.

Direção Artística
Sobre esse aspecto, não tem como negar que o visual de Astria Ascending é estonteante. Desde o primeiro trailer que eu assisti, me apaixonei pelo visual da obra. Tanto nos traços dos desenhos feitos à mão quanto na pintura também feita à mão. É um trabalho magnífico e que merece destaque.
Os cenários são todos muito bonitos, apesar de serem curtos. Mesmo sabendo que existe uma reutilização de recursos, não incomoda de nenhuma maneira. O menu do jogo é uma coisa de outro mundo, sério. Limpo e claro nas informações que passa, além de ser extremamente agradável navegar por ele (já que vai passar um bom tempo aqui, isso é importante).
Na parte sonora, não existe um destaque. As músicas não atrapalham, mas também não empolgam. No início, eu até ficava animado com a de batalha, mas logo passou, até porque a música é repetida diversas e diversas vezes. As melhores são as músicas calmas, que conseguem passar o tom no momento certo.
Astria Ascending vem dublado no inglês e no japonês. A dublagem em japonês é bem decente, principalmente para quem gosta. Porém, a dublagem em inglês é estranha. Não dá para dizer que é ruim, mas também não é no nível da japonesa.

J-Ster
Finalmente, vou falar sobre o mini-game principal do jogo.
J-ster é um jogo de tokens colecionáveis onde ganha quem terminar com mais tokens dominados. É um tabuleiro com sete espaços hexagonais e cada jogador seleciona cinco tokens para o jogo. Além disso, cada personagem que desafiamos possuem regras para aquela partida. Essas regras definem quais tokens serão adquiridos pelo vencedor e se será possível ver as peças do oponente ou não.
No início do jogo, um token de cada participante é selecionado de maneira aleatória e, também de forma aleatória, um deles vai para o centro do tabuleiro enquanto o outro sai do jogo. Depois disso, o perdedor dessa primeira disputa inicia colocando um token ao redor deste que ficou no centro. Posteriormente, o outro participante faz sua jogada e assim vai.
Para decidir o vencedor de turno, os tokens possuem um valor base e um modificador em cada lado do hexágono. Esses valores junto aos modificadores vão ditar qual token adjacente é virado ou não.
Pode parecer complexo explicando sem algo visual, mas pode acreditar, o sistema é bem simples e divertido. Minhas horas iniciais em Astria foram gastas todas no J-ster. Vale a pena gastar um tempo entendendo o jogo e conquistando novos tokens.
Não sei se é pedir muito, mas talvez pudessem explorar mais o J-ster, aumentando o tamanho do tabuleiro e coisas do gênero. Mas isso fica apenas como dica!

Conclusão
Como falei no início, não sei mais se JRPG’s são tão atraentes para mim como já foram uma vez. Astria Ascending é mais um deles que eu jogo e não tenho uma experiência muito agradável, tanto na parte da história quanto no combate. O enredo é arrastado e não mostra nenhuma motivação real por parte dos heróis, já o combate atrapalha por não ter elementos simples e que fariam toda a diferença. Pela forma que o jogo é construído, o combate acaba influenciando em quase toda a obra, o que torna a experiência cansativa. Porém, a parte artística é um show a parte e o J-Ster também é uma surpresa agradável. Caso você queria experimentar o Astria, é bom saber que você encontrará momentos de dificuldade por conta da velocidade do jogo, principalmente no combate.
*Chave cedida para análise