Introdução
Se você já teve curiosidade de ver aquilo que a TV não mostra, Not For Broadcast te dá o controle de escolher o que as pessoas assistirão em suas TVs, o que pode mudar o rumo de todo o país.
Desenvolvido pelo estúdio NotGames, e publicado pela Tiny Build, Not For Broadcast é um jogo que esteve em acesso antecipado desde 2019, mas sua versão completa só saiu agora, no dia 25 de janeiro de 2022 para PC via Steam.
Sendo um FMV, um gênero de jogos onde controlamos as ações de pessoas reais, já é um diferencial do que vemos no mercado, já que não temos muitas obras do tipo sendo lançadas. Mas, não é apenas por esta mera curiosidade que Not For Broadcast se destaca. Com um roteiro que mistura o hilário, o absurdo, mas também que gera muitos questionamentos sobre a realidade, este é um jogo que pode gerar muitas conversas sobre o papel da mídia em nossa vida, e como ela pode ser usada para guiar a opinião do público.
Na Sala de Controle
A jogabilidade de Not For Broadcast pode ser descrita como um Point and Click, já que nossas ações são limitadas a apertar os botões que temos em nossa frente. Aqui, assumimos o papel de um editor novato no jornal de maior audiência do país, no canal com a maior relevância. Até 10 minutos antes, seu trabalho era de um simples faxineiro, mas foi jogado nessa posição, pois o editor principal não chegou a tempo e você é quem estava na sala para atender o telefone.
Pelo telefone, o editor te ensina a operar a máquina de edição, e como vai funcionar o gameplay. Basicamente, você tem o controle de 4 câmeras no estúdio, e seu trabalho é escolher aquelas que darão o melhor ângulo para os telespectadores. Isso envolve algumas coisas, como sempre focar em quem está falando, mas não deixar passar muito mais do que 10 segundos na mesma visão, e tendo de ir trocando para manter a atenção das pessoas em casa. Seu desempenho é medido por uma barra de audiência no topo da tela. Caso a audiência caia muito, a transmissão falha, e você deve começar do zero.

Além das câmeras, você também deve cuidar da qualidade da imagem, e do funcionamento do seu equipamento. Assim, é seu trabalho controlar a antena de transmissão para ajustar o sinal, quando estiver sofrendo com interferências, e também lidar com aquecimentos e curto-circuitos no seu console.
Porém, outros fatores humanos também afetam a transmissão. Por exemplo, você deve ficar atento no botão de censura para caso alguém resolva falar algum palavrão, e com o decorrer da história, coisas ainda mais sensíveis, como opiniões indesejadas sobre o governo.
Escolhas e consequências
Pessoalmente, os desafios de manter a audiência alta, e evitar falhas na transmissão, não são a parte mais interessante do jogo. Elas estão lá para reter sua atenção, e o jogo não se tornar apenas uma sessão extremamente longa de vídeos de YouTube. Mas, o grande diferencial está nas decisões que você deve tomar durante importantes eventos da história.
A primeira transmissão que jogamos é a do discurso de posse do novo governo do país. Lá, eles prometem mudar tudo o que está de errado no país, levando a um futuro próspero. Porém, conforme os dias e anos passam, acompanhamos as diferentes consequências desta nova política, e os efeitos na sociedade, e na sua vida pessoal. Pois, além de cuidar da TV, você também terá de tomar decisões do lado de fora, em trechos só de texto. Aqui, você acompanha em primeira mão os efeitos de suas decisões, em como elas afetam a sua vida financeira, e o relacionamento com sua família.

Tais decisões estão relacionadas ao que você mostra ou deixa de mostrar na TV, àquilo que você censura, ou deixa passar. Pois, tendo o controle das câmeras, você também pode controlar a narrativa que está sendo apresentada. Durante uma transmissão, você pode decidir exibir as imagens que apoiam o governo, ou mostrarem seus opositores em uma visão mais favorável. A partir de certo ponto da história, você também pode ativar o botão de censura para calar falas que não condizem com o caminho que você quer que a história siga.
Assim, cada câmera, e cada *beep* mudam totalmente o rumo da história.
Sátira e o Absurdo
Apesar dessa temática bastante séria, de manipulação das massas pela mídia, o jogo tem uma dose bem grande de humor. Boa parte das reportagens e entrevistas que você acompanha são uma coleção de curta-metragens cheias de um humor absurdo. Sendo um grupo britânico, é fácil perceber inspirações em Monty Python em muitas dessas esquetes.
Seja uma reportagem sobre a cidade mais fedorenta do país, ou acompanhando a final do campeonato de Sportsboard, um esporte cujas regras envolvem arremessar uma bolinha, mímica e sons animalescos. É uma situação engraçada atrás da outra.

Dentro do estúdio, os convidados são bastante pitorescos, com celebridades locais, cantores, teóricos da conspiração, tem de tudo. Sempre trazendo algo para dar risada, e ficar de boca aberta na situação absurda.
Além disso, há diversos números musicais e apresentações de teatro que levam ao máximo essa situação de absurdo, e, por que não, de vergonha alheia. Decerto mostram o trabalho e dedicação desse pessoal em criar uma obra memorável e que nos fará gargalhar.

Claramente, isso tudo também serve para atingir o objetivo de críticas à mídia, à idolatria de celebridades fúteis, e a como fatos importantes acabam sendo jogados para escanteio, quando a realidade se torna incômoda. Mais fácil assistir a uma matéria sobre futebol de gatos do que pensar nos problemas no mundo.
Por Trás das Câmeras
Enfim, ao encerrar uma transmissão, você tem a opção de rever a gravação de sua transmissão, e de acompanhar as outras filmagens que não foram exibidas na televisão. Como dito acima, você tem de controlar quatro câmeras, mas apenas uma delas é a principal. As outras três, continuam gravando os repórteres, e suas interações por trás das câmeras. Muitos detalhes da história e dos personagens só são vistos assim. Podem ser comentários sobre o trabalho no jornal ou vida pessoal, e até comentários do que está acontecendo no país, e que o jornal não pode exibir.
O grande problema dessa abordagem, é que torna a tentativa de acompanhar toda a história em algo cansativo. Apesar de ter um roteiro ótimo e extremamente engraçado, o jogo ainda consiste em 90% do tempo, assistir a um filme. Infelizmente, isso é uma situação que cansa. Especialmente, que você levará muitas horas para completar um de seus finais, que existem muitos.

Como um jogo de escolhas, que afetam a história, Not For Broadcast apresenta 14 finais diferentes. Sem contar nas outras dezenas de pequenas variações nas transmissões, que apresentam reações e resultados diferentes, dependendo do que você decide transmitir ou omitir. São tantos detalhes diferentes, que eles simplesmente obliteraram o recorde como o jogo com o maior tempo de gravação de cenas em Live-Action, totalizando quase 43 horas de vídeo.
Assim, ter de acompanhar as transmissões normais, que já levam mais de 30 minutos para terminar, e depois repassar tudo para ver os bastidores, é uma atividade que desincentiva outras partidas. No final, mesmo gostando bastante do jogo, e de seu conteúdo, o cansaço de tanto assistir já estava consolidado, e foi um alívio ver os créditos rolando.
Conclusão
Com uma belíssima mistura de crítica social, e humor de absurdo, Not For Broadcast te faz rolar de rir e ainda pensar em questões sérias. Provocativo e hilária, sua história te prende desde o começo, e você se preocupa com o destino dos personagens.
Nem tudo funciona, no entanto. As sessões de texto, que falam da vida do seu personagem, não têm um grande impacto no gameplay. As decisões afetam o rumo da história, mas são apenas alguns cliques que avançam o jogo de uma forma, ou de outra. Além disso, ter de reassistir as transmissões para ver o que acontece nos bastidores, se torna bastante cansativo depois de um tempo.
Enquanto isso, as decisões tomadas na sala de edição já têm um impacto muito maior. O mais interessante, é que muitas delas não são binárias, em que basta escolher uma opção da lista. Mas sim, integradas ao gameplay, escolhendo as imagens a exibir para o público, ou as falas para censurar. Cada ação te leva para um caminho diferente, e para um dos 14 finais diferentes.
Assim, Not For Broadcast é um jogo inteligente, que não tem medo de também ser ridículo. Entre piadas, absurdos, e eventos sérios, Nor For Broadcast constrói uma experiência extremamente engajante, que você não esquecerá tão cedo.