Creepy, um suspense policial repleto de dúvidas
Creepy, é uma obra japonesa dirigida por Kiyoshi Kurosawa, em 2016. Tem como premissa ser um filme policial. No entanto se torna mais abrangente mesclando suspense, mistério e em determinados momentos um terror sutil.
A narrativa de Creepy apresenta a mudança de vida do detetive Takakura (Hidetoshi Nishijima), após ser demitido começa uma nova jornada com a esposa Yasuko (Yûko Takeuchi). Além de se tornar um professor universitário, decidem mudar de residência e passam a ser vizinhos de Nishino (Teruyuki Kagawa), um homem bastante misterioso que de maneira sorrateira entra na vida de Takakura e Yasuko.
Deste modo, a trama se desenvolve entre o místico e o real. Apesar de não atuar mais como detetive, Takakura aceita o convite de seu colega Nogami (Masahiro Higashide) para investigar um caso não solucionado. Curiosamente, durante as investigações a vida do casal e a de Nishino se encontram.
A conjuntura da obra consegue entrelaçar diversos assuntos e não aprofunda nenhum, trazendo o ar ambíguo e de certa forma desconhecido. Essas características não são negativas, ao contrário, são essenciais para determinar o ritmo. Eis que ao invés de focalizar nos personagens e na narrativa, Creepy trabalha o movimento interno da obra, ou seja, a essência, à procura de causar estranhamento e incertezas.
A alternância entre luz e sombra
Como foi dito, Creepy é uma obra que não se limita apenas a narrativa policial, mas se estende também para o terror que advém do desconhecido. Isto é, essa tensão é criada por elementos visuais e sonoros.
Na obra, o terror é mostrado, porém, não está escrachado e de certa forma gera estranhamento porquê não se sabe qual é a categoria de terror. Entretanto, o objeto que emana esse sentimento é conhecido, porém, o interior do objeto é desconhecido. Em outras palavras, o horror vem do personagem de Nishino e não sabemos quem ele é de fato.
Para alcançar essa sensação as formas visuais são essenciais. Tendo como destaques centrais o movimento de câmera e a iluminação. Quanto aos movimentos realizados são bem diversificados, pois se adéquam a narrativa para exacerbar os momentos de tensão. Enquanto isso, ao abordar a iluminação é perceptível a presença de uma dualidade. Há um jogo ríspido entre luz e sombra.
A inquietude em Creepy é alcançada através de movimentos de câmera sutis e criativos que colocam os personagens em situações de superioridade e inferioridade. E ao unir com a dinâmica que ocorre entre luz e sombra gera o ar de terror. Isso é visto quando é apresentada na mesma cena a conjuntura de um personagem na luz e outro na escuridão. E essa estrutura ajuda na composição, exacerbando alguns traços marcantes de cada um deles.
Além da alternância entre luz e sombra em Creepy há um elemento constante, a presença da natureza. Deste modo, traz suavidade e o terror não pressiona o tempo todo. Cria a atmosfera de mistério e impede que a obra se torne um típico filme de horror. Ou seja, traz originalidade não permitindo que o filme caia num lugar comum.

O ruído da natureza contrastando com músicas que causam apreensão
Além da questão visual causar tensão, a trilha sonora funciona de modo harmônico tanto com os aspectos da iluminação quanto com os movimentos de câmera. Ou seja, sem o elemento sonoro o alcance realizado por meio da imagem, em determinados momentos perderia a intensidade. Visto que Creepy é mais marcado mais por um clima de terror do que pelo terror em si e o que cria essa atmosfera é a união entre som e imagem.
Nessa perspectiva, através da trilha há a acentuação do mistério que atravessa toda a obra, mas para isso a presença da música em Creepy é pontual. Isto é, não surge em qualquer momento, mas nos momentos em que por meio da luz e sombra a narrativa se torna mais intensa.
E como a música não é constante para preencher essa ausência é usado o ruído da natureza presente no cenário que está ao redor dos acontecimentos. Então é possível escutar o som das árvores tendo suas folhas agitadas pelo vento e pássaros que nunca são mostrados. Esse clima leve é construído durante toda a obra e quando se apresenta o terror, mistério e suspense, os elementos se tornam contrastante.
Entre o sobrenatural e o real
A cadência de Creepy é lenta, no entanto, não torna a obra desinteressante, visto que a abordagem é atrativa. Sendo assim, a lentidão presente contribui para desenvolver o clima de mistério e gradualmente ir aumentando a proporção do filme.
Ademais, a obra tem o ritmo quebrado intencionalmente dando a impressão de que o título está tentando seduzir o espectador. Quando a tensão está chegando ao ápice repentinamente o ritmo é cortado para algo sutil, e essa mudança inesperada causa inquietação. Em resumo, a obra nunca entrega tudo, mas entrega o suficiente para atiçar o público.
Em razão de mecanismo como esses, o volume da trama cresce bastante, a aparência inicial do filme é um suspense policial que no decorrer se transforma em algo místico. Sendo assim, mescla realidade com elementos que podem direcionar ao sobrenatural, no entanto, não apresenta fatos que confirmem essa teoria. Ou seja, não há nada que comprove que algo sobrenatural está acontecendo, mas a realidade se torna tão extraordinária que induz a acreditar em forças ocultas.
E essas duas esferas tanto a aparente quanto a sensorial se desenvolvem em conjunto, estão conectadas e caminham lado a lado. Isso acontece porque a maneira de se contar a história se dá através da oscilação. Apresenta numa cena o desenvolvimento da narrativa policial que tem como personagem central Takakura, e a cena seguinte já é a interação de Yasuco com o misterioso Nishino, e a trama chega num ponto em que esses fatos isolados se encontram e passam a se desenvolver conjuntamente.
A atmosfera de Creepy como elemento central
Creepy é uma obra que já se inicia com o protagonista em ação fechando e começando um ciclo de sua vida. Takakura é um ex-detetive iniciando uma nova vida com Yasuco, sua esposa, mudam de residência e ele começa a carreira de professor universitário.
Diferente de outras obras, o clima do filme se torna mais potente do que os personagens. A curiosidade de entender o que está acontecendo instiga o público, e o fato dos personagens não apresentar profundidade aumenta o ar de mistério.
Em Creepy nada é óbvio. O diretor apresenta a trama de um modo que não impõe ao espectador sua perspectiva, deixa espaço para cada pessoa tirar as conclusões sobre o que de fato está acontecendo no interior da obra. Entretanto, a forma a qual o filme é construído gera a sensação de que os acontecimentos externos escondem um elemento sobrenatural.
Por fim, o terror no filme não tem como característica ser clichê, não procura causar reações imediatas e eufóricas no observador. O terror presente na obra se faz através da estética e ao invés de provocar sustos tem como perfil central a intensão de causar estranhamento e incômodo no espectador. E deste modo, permite que uma experiência sensorial capaz de acarretar reflexões seja alcançada.