| Introdução
Visage é um jogo de terror psicológico em primeira pessoa desenvolvido pela SadSquare Studio e lançado para PC, PS4 e Xbox One no dia 29 de Outubro. Desde que foi anunciado em 2017, tem causado bastante curiosidade nos fãs de jogos de terror, por sua proposta de ser a realização do jogo que o famoso P.T. do Kojima deveria ter sido, antes de ser cancelado pela Konami. Mas será que um jogo Indie feito por 5 pessoas, conseguiria causar o mesmo impacto?
| Medo do Escuro
Devo começar este review já respondendo à pergunta: sim, Visage é extremamente assustador e bem feito como um jogo de terror, sem ter que apelar para jumpscares baratos, ou cenas de gore apelativas. Não, Visage utiliza de uma estratégia muito mais sutil e efetiva do que isso. Ele utiliza nosso medo do escuro e daquilo que pode estar escondido nas sombras, local onde não conseguimos entender direito o que está a nossa frente.

Todo o jogo se passa dentro de uma grande casa, completa com diversos quartos, um porão e um sótão, e ao longo de uma única noite chuvosa. O tamborilar das gotas de chuvas, o uivo do vento e o ranger das tábuas de madeira do piso, são sons que te acompanharão por toda a experiência. E som de passos distantes, portas se abrindo e de uma suave respiração que não a sua, também estarão lá.
A grande sacada no terror deste jogo é utilizar de um medo real que temos quando nos encontramos em algum lugar desconhecido, especialmente sozinho e no escuro. É um medo irracional e bobo que todos temos, um medo de talvez ver algo estranho no meio do caminho. Pois bem, aqui este medo é tornado real. No início, conforme exploramos a casa, coisas estranhas acontecem, como uma porta antes fechada se encontrar aberta, ou a luz do quarto se apagar sozinha enquanto você vasculha as gavetas do armário em busca de pistas. São coisas pequenas e bobas mas que nos enchem de terror pois esta acontecendo exatamente aquilo que tememos que aconteça na vida real.
| Talvez sua mente te prega peças

Mas não são apenas de sustos bobos que Visage nos apresenta. A história do jogo é dividida em 4 capítulos. Os três primeiros podem ser feitos em qualquer ordem e contam a história de um dos fantasmas que assombram essas paredes. Temos o capítulo da Lucy, uma garotinha com um amigo imaginário nada amigável, o capítulo da Dolores, uma velha senhora com demência que sonha em recuperar seu filho, e o capítulo do Rakan, um homem que sofre com severas alucinações. As histórias não são contadas de forma direta ao jogador, dependendo bastante de interpretação e suposições sobre o que ocorre.
Talvez esses espíritos são de pessoas que morreram na casa? E há quanto tempo está acontecendo isso? Há alguma relação entre estas histórias, além do fato de começarem na casa, para depois partir para o surreal e te levar a locais estranhos? E quem é esse homem que estamos controlando, que matou uma família inteira a sangue-frio no primeiro minuto de jogo? Nenhuma dessas perguntas é respondida de forma direta, então todas as interpretações são válidas.
Cada capítulo conta uma história de terror diferente, e se utiliza de mecânicas diferentes para lidar com as assombrações. No capítulo da Lucy, por exemplo, recebemos uma câmera fotográfica cujo flash consegue revelar coisas invisíveis ao olho nu, como desenhos horrendos nas paredes, ou vultos assustadores no topo da escada que devemos subir. Já na Dolores, espelhos começam a aparecer espalhados pela casa, que quando estilhaçados revelam passagens para locais estranhos. É uma boa forma de manter o jogador atento e na ponta da cadeira, pois os sustos são imprevisíveis.
A mecânica do jogo revolve em torno de lidar com recursos escassos. Você pode levar itens nas mãos, ou guardá-los em um dos 5 espaços de inventário disponíveis. Você pode carregar isqueiros, velas, lâmpadas e remédios calmantes. Este jogo também conta com uma mecânica de sanidade que vai diminuindo quando você encontra algum evento paranormal, como um rádio que se liga sozinho, ou passa muito tempo em um local escuro. Quanto menor sua sanidade, mais frequente e violentos são os eventos paranormais. Os calmantes servem para se recuperar quando ela cai demais, e as velas e lâmpadas ajudam a manter o ambiente iluminado.

| Você sente que algo te observa
Para avançar nos capítulos, o jogo exige que você resolva diversos puzzles espalhados pela casa, que geralmente consiste em encontrar alguma chave para abrir alguma por trancada, ou ferramenta que te permita chegar a outro cômodo obstruído. E enquanto você vasculha a casa, não se esqueça de que você não está sozinho nela. Cada capítulo tem uma assombração que ronda os corredores, e pode aparecer a qualquer momento. A aleatoriedade com que elas aparecem adiciona na tensão do jogo e na sensação de paranoia que desenvolvemos, vendo vultos com o canto do olho onde não tem nada (ou tinha e desapareceu assim que você olhou?). Resolver esses puzzles são o seu principal objetivo, mas também foram a fonte da minha maior crítica ao jogo.
Era constante a sensação de estar perdido, de não saber o que fazer para avançar. Às vezes era preciso encontrar uma chave pequena escondida em algum canto da casa, chave essa que não recebe nenhum destaque do ambiente e é fácil de não ser vista, ou pior, quando a chave é um objeto que você não tem ideia que seria algo importante. Ter que vasculhar cada gaveta e armário em busca de algo que possa ser usado, foi uma fonte de frustração, especialmente quando você começa a ficar sem isqueiros para iluminar o caminho. O capítulo do Rakan é especialmente culpado dessa frustração, pois ele aumenta demais a área que precisa ser explorada, e muito tempo é gasto sem nenhum progresso.

Isso deu uma boa afetada na experiência, pois o jogo brilha nos momentos em que você não precisa ficar andando para lá e para cá, mas quando o jogo deixa claro o que é preciso fazer, ou quando sua única opção é seguir e aguentar o que Visage irá jogar na sua direção. Explorar a casa é uma experiência incrível e aterrorizante, pois há muitos segredos e sustos a serem descobertos, porém, quando você não sabe o que está procurando, a exploração acaba por se tornar frustrante e os sustos diminuídos quando você se acostuma com seus corredores. Lógico que essa familiaridade também te leva a decorar onde está cada móvel e decoração da casa, então quando algo muda de lugar, fica perceptível, portanto é uma “faca de dois-gumes” que ajuda e atrapalha em simultâneo.
| Eu temo que algo está sempre por perto
O trabalho de design da casa e dos fantasmas, assim como o trabalho feito com a iluminação e o design de som deste jogo estão horríveis (no bom sentido). A casa é quase fotorrealismo, com seus móveis e utensílios domésticos passando um ar de normalidade, e que esta poderia ser uma casa muito aconchegante, não fosse o fato de termos espíritos perturbados caminhando pela casa. As assombrações são bem variadas, e com designs perturbadores que dão medo só de olhar, e mais medo ainda quando estão vindo em sua direção.
A iluminação é feita de forma a deixar tudo com sombras extremamente escuras, deixando tudo com um ar de estranho, isso quando a iluminação não passa para o surreal, como quando uma das portas ganha um brilho vermelho passando por entre as frestas. O trabalho de sombras e luz é muito bem utilizado para dar um ar aterrorizante às aparições, que nunca são vistas de forma direta.

O trabalho de som merece elogios por utilizar de uma música minimalista em momentos de calmaria, mas que cresce de forma repentina quando algo paranormal acontece. Basicamente, os jumpscares desse jogo vêm principalmente do som do que o que ocorre na tela. E há sempre um som incômodo de fundo que te deixa alerta, procurando sua fonte.
| Conclusão
Visage é um dos jogos de terror mais aterrorizantes que já joguei. Sua combinação de uma atmosfera opressiva, passagens escuras e aparições “de canto de olho”, tornam a experiência algo incrivelmente desconfortável, e boa. Seus puzzles incomodam com respostas pouco óbvias e muita tentativa e erro, mas quando os resolvemos somos recompensados com mais uma dose de terror de fazer o coração pular, os pelos se arrepiarem, e os olhos se fecharem instintivamente.