Amores Brutos, drama visceral que cruza três histórias numa única tragédia
Amores Brutos é uma obra mexicana dirigida por Alejandro González Iñárritu, em 2000. Apesar de existirem outros aspectos marcantes, o elemento que se sobressai é o roteiro realizado por Guillermo Arriaga. A trama apresenta de forma não linear três histórias que se entrelaçam e seus protagonistas sofrem desventuras. Amores Brutos é um drama que tem como plano de fundo determinações socioeconômicas perpassando todos os personagens.
A primeira história traz Octavio, um jovem que vive com sua mãe, cunhada, irmão e sobrinho numa pequena casa e vê possibilidades econômicas ao levar seu cão para batalhar numa rinha. O personagem é movido pelo desejo alimentado por Susana, sua cunhada.
O segundo núcleo dramático apresenta Daniel e Valeria, um casal de amantes. Ele abandona sua família para viver com Valeria, uma top model que está no auge da carreira.
Por último e não menos importante é apresentada a história de Chivo. Um homem que se encontra em situação de miséria em razão de acontecimentos do passado. Ele está à procura de redenção e do amor de sua família.
Todas tramas apresentam pessoas em busca de algo e têm essa busca frustrada, ao invés de alcançar o objeto desejado elas acabam se distanciando ainda mais.
Amores Brutos se sedimenta num fato dramático que afeta diretamente a vida dos protagonistas, um acidente de trânsito. A partir daí começa-se a desenvolver essas três histórias (Octavio, Valéria e Chivo) simultaneamente fragmentadamente. Contudo, para não confundir o público há uma divisão metódica focalizando num só enredo por vez, mas traz elementos das outras histórias que vão se costurando até o momento da síntese.
Em suma, Amores Brutos é uma obra visceral centralizada na tragédia. Os personagens constroem uma expectativa que resulta numa realidade brutal, e só lhes cabe o enfrentamento.
Os cenários refletindo as diferenças sociais entre os personagens
A estética de Amores Brutos é tão violenta quanto o enredo, pois a obra é construída através de dramas externos. E o fato dramático central é um acidente, deste modo a cor que mais se apresenta na obra é o vermelho. A presença do sangue se torna comum, tanto no acidente que conecta às três histórias quanto nas rinhas de cães que Octavio participa com seu cachorro.
No entanto, a agressividade não está apenas nas ações dos personagens, mas também no movimento de câmera. O equipamento se comporta de forma instável e rude, age como um personagem, ou seja, não é apenas observador, mas participa da história ativamente.
No mais, os cenários de Amores Brutos deixam evidente a diferença social entre cada núcleo narrativo. Octavio (Gael García Bernal) mora com uma família numa casa pequena e bem simples. Chivo (Emilio Echevarría) vive num armazém com poucos meios de confortos. Enquanto isso, a personagem Valeria (Goya Toledo) vive num apartamento no centro da cidade. O acidente que ocorre entrelaça todos eles, deixando-os numa situação comum, porém com resultados diferentes.
Tais diferenças sociais entre os personagens estão bem nítidas não só nos lugares que cada um frequenta como também na caracterização em geral deles, pois, esses traços são acentuados. Por exemplo, o personagem Chivo vive num lugar com condições precárias de higiene e isso reflete na sujeira de suas unhas, etc. Em suma, essa situação a qual ele se encontra e como é transmitida visualmente também é uma forma de violência. Isto é, não é só o acidente, as rinhas de cães e os conflitos diretos entre alguns personagens que são elementos extremamente agressivos, mas também a desigualdade social.

A trilha sonora acentuando as características da obra
Como foi dito, Amores Brutos é uma obra visceral, contudo não é apenas o enredo e os aspectos visuais que trazem esse clima, a trilha também é marcante. As canções presentes na obra além de ter um ritmo pungente contém letras carregadas de significados compatíveis com a atmosfera do filme. Além disso, as canções são elementos que fortalecem a identidade latina que a obra possui. Ou seja, a trilha sonora de Amores Brutos de certa forma influência na mensagem que a obra deseja passar e no conceito geral do filme.
Ademais, os ruídos presentes na obra moldam os ambientes que os personagens frequentam e contribui para adaptá-los à narrativa. Para causar a naturalidade nos cenários e criar essa atmosfera em Amores Brutos o som é captado diretamente. Em outras palavras, a atmosfera sonora é compatível com a visual e causa a sensação de que tanto as imagens quanto o áudio foram captados no mesmo instante. Um exemplo, é o ruído que os cães emitem durante as brigas, é bem intenso e o som dá volume à imagem transmitida.
A unificação da trama
Amores Brutos não é uma obra dramática com o ritmo inerte, é um drama repleto de ações violentas. No entanto, o momento que há o traço de uma categoria de ação mais frenética é a cena do acidente. Contextualizando, se trata dos instantes iniciais da obra em que Octavio está envolvido na perseguição que resulta em tragédia. Entretanto, ao longo da obra esse clima não persiste.
Para evitar um ritmo frenético e também para dar uma quebra e não confundir o espectador durante a trama, são usados diversos meios. Um deles é o uso da tela preta, quando alguma ação é interrompida ou a trama focaliza no núcleo dramático de outro personagem a tela escurece. Esse mecanismo se torna no decorrer da obra um elemento que o público já consegue identificar.
Ademais, o ritmo de Amores Brutos se destaca, pois, trata-se de um roteiro complexo, não só por ser três histórias, mas a forma com que cada uma delas se apresenta. Há núcleos isolados, porém durante toda a trama eles se cruzam para no final chegar numa síntese. Logo, ainda existe o desafio de cada história estar num momento diferente, umas estão no fim enquanto outras estão apenas começando. Apesar da complexidade, Amores Brutos consegue construir uma obra capaz de unir esses fragmentos.
Amores Brutos apresenta a frustração dos desejos e a capacidade de recomeçar
Por fim, Amores Brutos não apresenta personagens com estereótipos positivos, são pessoas reais repletas de defeitos lidando com resultados negativos de suas escolhas. E de certa forma os personagens não são aprofundados, pois, o fato dramático que vivem sobressai aos conflitos internos. Além de tudo, trata-se de uma história com pluri protagonistas, há vários personagens em busca do mesmo objeto, o amor. Entretanto, cada um está em busca de um amor diferente, esse sentimento não é observado na obra através de uma perspectiva pura e sublime.
Como foi dito, os personagens não apresentam muitas contradições, porém um deles apresenta mais camadas, Chivo. A sua linha narrativa é desenvolvida de maneira gradual. Ele se encontra em outro estágio da vida, enquanto os outros estão enfrentando o fracasso Chivo está arruinado.
Em síntese, Amores Brutos traz como cerne a falta de controle que o ser humano tem sob seu destino e a responsabilidade que tem em suas escolhas e desejos. A obra apresenta de forma cruel momentos em que a realidade frustra as expectativas. Os personagens enfrentam perdas irreparáveis e a única opção que lhes resta é o conformismo de recomeçar entre ruínas.