Introdução
Com uma completa reimaginação do primeiro jogo da série Final Fantasy, Stranger of Paradise traz uma jogabilidade divertida e um sistema de jobs interessante, mas cuja história é uma grande sopa de ideias, que complica algo que deveria ser simples.
Desenvolvido pela Square Enix e pela Team Ninja (o estúdio responsável pelo excelente Nioh, cuja análise você pode ler aqui), Stranger of Paradise: Final Fantasy Origin foi lançado no dia 15 de março de 2022 para Playstation 4 e 5, Xbox One e Series, e para PCs pela Epic Store.
Primeiras Impressões
Dizem por aí que a primeira impressão é a que fica. Pois bem, em relação a Stranger of Paradise, esta primeira impressão foi desastrosa. Depois daquele primeiro Teaser, onde a palavra Chaos foi usada como sinal de pontuação, minhas expectativas pelo jogo estavam mornas. Claro, as cenas de luta pareciam interessantes, mas a narração gerou uma certa desconfiança. Então, alguns meses depois, pude finalmente pôr as mãos nesta obra, e iniciar minha batalha contra o Chaos! No entanto, a “segunda primeira impressão” não melhorou nem um pouco.
Primeiramente, os personagens estavam lá apenas para entregar diálogos expositivos, tendo pouca personalidade própria, com exceção do protagonista, Jack. Este, pelo menos, é um personagem memorável pela sua simples e poderosa determinação em matar o Chaos!, algo que o teaser já deixara bem claro. Além disso, o combate e a exploração estavam bem tediosos, onde os inimigos apresentavam pouco desafio e variedade, e os jobs disponíveis eram bem simples, faltando personalidade. Os cenários, apesar de bonitos, ofereciam pouca exploração, sendo basicamente um longuíssimo corredor reto até o boss final.
E foi dessa forma que as primeiras 5 horas do jogo se arrastaram para mim. Apenas avançando pelas fases, sem realmente estar me divertindo, e contando as horas para ele acabar. Porém, algo de curioso aconteceu.
Comecei a realmente gostar do jogo.
Dizem por aí que a primeira impressão é a que fica. Pois bem, em relação a Stranger of Paradise, esta frase se mostrou um grande erro. Pois, apesar do início tedioso, a jogabilidade evolui de uma forma bastante satisfatória, e os cenários deixam de ser simples corredores. No entanto, a história ainda me deixou com dúvidas de sua qualidade.
Combatendo o CHAOS!
Primeiramente, falaremos do gameplay. Stranger of Paradise é um action RPG, cujo combate é uma meio termo entre um Soulslike e Hack’n’Slash. Isto é, as batalhas são bem rápidas e seu personagem tem diversos combos à disposição, mas os inimigos têm ataques que podem te derrubar facilmente, o que também incentiva uma jogabilidade mais cuidadosa. Os comandos são os clássicos ataque rápido e forte, sendo que você pode equipar habilidades nas diferentes combinações. Por exemplo, dois ataques rápidos e um ataque forte ativa uma habilidade diferente do que um ataque rápido e um forte.
Além da barra de vida, seu personagem tem uma barra de defesa que, se quebrada, o deixa completamente vulnerável e incapaz de se mover por alguns segundos. Tal barra também está presente nos monstros, e quebrá-la permite que você execute um ataque especial, chamado Soul Burst, que os mata na hora.
Este Soul Burst é importante também para aumentar o limite do seu MP. No começo de cada fase, seu personagem tem apenas duas barras de MP, mas pode ter até 6, conforme executa monstros com Soul Burst. Cada habilidade gasta algumas barras de MP, com algumas das mais poderosas usando até 3. Para recuperar MP, basta acertar ataques normais, ou eliminar monstros com o Soul Burst.
Há 9 tipos de armas diferentes no jogo, incluindo espadas de uma mão, adagas, katanas, e até luvas. Cada uma com suas próprias características. Enquanto uma Greatsword é boa em dar dano em uma grande área, um Mace recupera seu MP mais rápido, o que te permite usar habilidades com mais frequência. Assim, alterar a arma também muda completamente seu estilo de jogo.
Lutando com Classe
O jogo dá uma grande ênfase no seu sistema de Jobs. Seu personagem não tem um level próprio, como em RPGs mais tradicionais. No entanto, cada Job tem seu próprio level e árvore de habilidades. Estes Jobs determinam quais armas seu personagem pode usar, e cada um tem uma habilidade especial própria. Enquanto o Black Mage pode invocar diversas magias elementais, o Paladino cria uma barreira que diminui o dano, e recupera a vida da sua equipe.
Estes jobs também são divididos em ranking, começando nas básicas, passando pelo avançado, e por último em expert. Inicialmente, você tem acesso apenas às jobs básicas do Swordsman, Duelist e Pugilist, mas libera os outros jobs básicos ao encontrar as armas apropriadas, logo na primeira fase. Cada job básica libera duas avançadas, e os expert precisam de duas ou três avançados completas para liberar.
Ao pegar level com um job, você ganha pontos de habilidade para gastar na sua respectiva árvore. Aqui, você libera habilidades passivas, que aumentam algum atributo, como força, agilidade ou vida, e habilidades ativas. Estas habilidades são liberadas para uma arma em específico, e podem ser usadas por outros jobs. Então, se você libera uma habilidade para a lança com o Lancer, ainda pode equipar esta habilidade ao evoluir para um Breaker.
Dessa forma, temos oito jobs básicos, dez avançados e dez experts, totalizando vinte e oito classes. Opção é o que não falta.
Fashion Fantasy
Um jogo de RPG não ficaria completo sem muitas roupinhas para equipar. O sistema de equipamentos em Stranger of Paradise segue a mesma mecânica usada em Nioh. Isto é, o jogo é dividido em missões, cada uma tendo um level recomendado para fazer. Este level também afeta o nível dos equipamentos que você encontrará ao derrotar monstros. Assim, ao entrar em uma missão de level 50, todos os equipamentos terão status proporcionais a este nível.
Além do level, os equipamentos têm um nível de raridade, e uma afinidade com uma classe. A raridade funciona igual outros jogos, com itens indo de um até 6 estrelas, ficando mais fortes conforme o número de estrelas. Já a afinidade é um conceito diferente.
Cada classe tem diversos níveis de afinidade, dependendo da pontuação, que liberam bônus para seus status. Assim, se você equipar um item com afinidade de 60% para Swordsman, irá receber bônus para sua força e vida. O máximo de afinidade que você pode chegar com uma classe só é de 400%. Dessa forma, um equipamento com raridade e level maior, pode não servir para a sua build, pois tem a afinidade com um job que não te ajuda.
Mas não se preocupe, pois a quantidade de equipamentos que você consegue em cada fase é enorme, o que até causa problemas depois para organizar seu inventário.
Por Que não funcionou no começo
Explicado como o jogo funciona, podemos falar sobre seus problemas, que quase me fizeram desistir no começo.
Primeiramente, temos de falar do design das fases. De início, os cenários que visitamos têm pouca coisa acontecendo, e não há nada de interessante para encontrar. As primeiras missões são simples corredores, onde não há como errar o caminho. Assim, você apenas segue em frente sem prestar atenção no caminho, derrotando os inimigos que vão aparecendo. Estes inimigos também não apresentam muito desafio. O primeiro chefe que enfrentamos, Garland, ainda traz um bom desafio, mas os seguintes são simples “esponjas de dano”, que demoram para morrer, mas não têm padrões complicados de desviar ou defender.
O sistema de jobs não empolga no começo, com as classes fazendo pouca diferença. Mesmo depois de liberar o Black Mage, com suas magias, ainda era mais vantajosa simplesmente ir para o ataque físico, devido ao longo tempo para carregar cada feitiço.
Fora isso, o fato de a força dos equipamentos estar ligado ao level da fase, significa que na próxima fase conseguirei itens ainda melhores do que tenho agora. Portanto, não preciso me preocupar com o que tenho equipado no momento, que ficará rapidamente obsoleto, assim que terminar esta missão.
Para piorar, a história não estava ajudando em nada. Fora os momentos “meme” com o protagonista, Jack, sendo um grosso com todo mundo, a história estava apenas seguindo de um lugar para outro sem muito desenvolvimento, e os personagens com zero carisma.
E assim, tudo conspirava para ser uma decepção, um grande potencial perdido. Mas, foi aí, que chegou Tiamat.
Por que passou a funcionar
Minha opinião do jogo começou a mudar ao enfrentar um dos bosses do game, Tiamat. Este chefe tem duas fases, sendo que a primeira é uma batalha bastante padrão, desviando de ataques e aproveitando as brechas para soltar alguns golpes. Ele é bem mais agressivo do que tudo que já enfrentei até então, o que é uma boa mudança de ritmo. Mas, então, chega a sua segunda fase. Nesta, há uma mudança que fez toda a diferença. Ele a cada poucos minutos, usa uma habilidade que recupera sua vida completamente. Derrotá-lo parecia uma tarefa impossível, não fosse um detalhe: é possível diminuir a barra de defesa máxima do chefe.
Portanto, o segredo para derrotá-lo estava em conseguir uma combinação de Job, equipamentos e habilidades para reduzir esta barra de defesa o suficiente para usar um Soul Burst. E então, depois de muitas tentativas, consegui derrotá-lo. A sensação desse feito ficou no mesmo nível de derrotar qualquer chefe em um Souls-like da From Software.
Mais que isso, pois foi a partir daí que o jogo ficou com outra cara. As dungeons ficaram mais complexas, os monstros normais passaram a usar mais habilidades, e os chefes cada vez mais desafiadores. Muitos dos problemas com a jogabilidade que estavam me incomodando nas primeiras horas pareceram se resolver como mágica, e passei a me divertir muito mais com o jogo.
Ainda há problemas
Mesmo assim, algumas coisas não se resolveram com o tempo. A própria história é uma grande bagunça, que dá diversas voltas para tentar reescrever o que era algo simples no primeiro jogo. Eventualmente, eles até explicam a obsessão do Jack pelo Chaos, que levou àquele primeiro trailer, mas é algo instatisfatórioa. Os personagens não têm personalidade própria, sendo que a fala de qualquer um poderia ter sido dito por qualquer outro da equipe. Como a história foi escrita pelo mesmo roteirista de Kingdom Hearts, já dava para esperar por muitas maluquices, e aqui não faltam. Ao menos, pode-se dizer que foi divertida, apesar dos pesares.
Até o final não me importei com os equipamentos de meus personagens, escolhendo apenas aquelas que me ajudariam a evoluir as classes. Só em chefes passava a prestar mais atenção, ou em missões secundárias difíceis.
Os gráficos, também são problemáticos. Como o jogo foi pensado para rodar em jogos da geração passada, então eles não são muito elaborados. O design de monstros e das roupas dos personagens é bem legal, mas nada muito complexo. Mesmo assim, quedas de frame foram comuns, mesmo estando em um PS5, especialmente durante as Soul Bursts, em que os monstros viram cristais e explodem. Isso quase sempre causava uma queda de frames.
Da trilha sonora, pelo menos, não tenho muito do que reclamar, sendo composta por veteranos da série Final Fantasy. Como cada missão se passa em uma fase inspirada em locais de jogos da série, seus temas são reimaginados aqui, o que traz certa nostalgia para os fãs. Mas, também apresenta diversas trilhas inéditas, que tendem ao eletrônico, estilo dub-step, o que para mim ficou bastante estranho com o resto.
Conclusão
Apesar de uma primeira impressão ruim, terminei Stranger of Paradise: Final Fantasy Origin tendo uma opinião bem positiva do jogo. A bagunça da história e seus personagens é balanceada por um combate bem divertido e um sistema de evolução satisfatório. Muitos Jobs para evoluir, e um constante fluxo de novos equipamentos, me fizeram ficar sempre de olho em como maximizar a evolução do personagem, e liberar todas as classes. As poucas restrições para experimentação também incentivam o jogador a buscar uma combinação de armas e habilidades que melhor se encaixam com seu estilo de jogo.
Quedas de frames, algumas dungeons com design ruim, e personagens sem personalidade estão entre os pontos negativos do jogo. No entando, seus problemas, no final das contas, não foram maiores que seus pontos positivos. Dessa forma, este final fantasy arriscou fazer algo bem diferente do que estamos acostumados a esperar da série, não acertando em tudo o que tentou fazer, mas que ganha pontos pela audácia em fazer algo único e inesperado.